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Entendendo e contextualizando a PEC 181

13/11/2017, às 12h12

Por Laina Crisóstomo 1

 

Na última quarta feira (08/11) foi votado em Comissão Especial da Câmara de Deputados Federais em Brasília proposta que prevê a criminalização do aborto, incluindo os casos previstos em lei. O mais perverso dessa votação é que ela foi realizada por homens, foram 18 homens votando o direito das mulheres.

A verdadeira proposta da PEC era tratar sobre licença maternidade para bebês prematuros e foi feita uma articulação doentia para mudar o rumo real da PEC que passou a tratar sobre a concepção da vida, o início da vida e criminalizar todos os tipos de interrupção de gravidez, incluindo as formas já previstas em lei, como nos casos de estupro, nos casos de risco à vida da mãe ou da vida do bebê e também da decisão do STF de aborto de fetos anencefalos.

Atualmente no Brasil 1 mulher é estuprada a cada 11 minutos, após o estupro é necessária a realização de profilaxia especifica para evitar que sejam contraídas DST e também que da violência seja ocasionada uma gravidez, são ingeridas pílula do dia seguinte. No ano passado as Bancadas fundamentalistas queriam de toda forma impedir que mulheres vítimas de violência sexual tivessem acesso a esse atendimento na rede pública de saúde, os movimentos foram para rua e conseguiram barrar esse absurdo e retrocesso.

Faz alguns anos, mais precisamente no ano de 2013, essa mesma Bancada criou uma proposta de Bolsa Estupro, que era chamada de Estatuto do Nascituro, ou seja, se a mulher que fosse estuprada quisesse prosseguir com a gravidez, receberia um auxílio do governo para criar essa criança fruto da violência e quando o pai (o estuprador) saísse da cadeia, este teria o direito de registrar a criança e visitar, garantindo a ele o “direito de ser pai”. E o direito dessa mulher? Já era o início da PEC 181, também conhecida como Cavalo de Tróia.

Mulheres vão às ruas protestar contra retirada de direitos. (08/03/2017)

Antes havia no Congresso Nacional 3 bancadas fundamentalistas que se uniam para votar contra os direitos humanos, direitos das mulheres, das e dos trabalhadores, comunidade quilombolas, eram as bancadas do boi, também conhecida como Bancada Ruralista,  a dos latifundiários, detentores de muita terra, favoráveis a transgênicos, contra Movimento Sem Terra, contra reforma agrária, a favor do agronegócio que destrói a agricultura familiar e contra as comunidades remanescentes de quilombo e povos indígenas. A segunda bancada é a da Bíblia, conhecida também como Bancada Religiosa, que defendia somente seus interesses religiosos, combatendo tudo que fosse voltado aos direitos humanos, como os direitos das mulheres, direitos da população negra e da população LGBT ou mesmo o combate à intolerância religiosa, são os religiosos que não pensam na coletividade.

A terceira bancada é a da Bala, também conhecida como a Bancada da Segurança, o nome já é a definição do que defende essa bancada, defende a redução da maioridade penal, defende penas mais severas, é composta por policiais, militares e inclusive ex torturadores da ditadura militar. Aplaudem chacinas em comunidades periféricas e defendem lemas como “Bandido bom é bandido morto.”

Entretanto o que essas bancadas tem a ver com a PEC 181? Essas bancadas se uniram e hoje atuam todo o tempo juntas para aprovação de projetos que tirem direitos das mulheres, dos pobres, da população negra, como a Reforma Trabalhista, Reforma da Previdência, contra o Decreto dos povos e comunidades tradicionais (quilombolas e indígenas), contra o aborto, contra LGBT e em favor de projetos violentos como “cura gay”, redução da maioridade penal, desrespeito com o Estado Laico entre outras pautas agressivas. Bolsonaro da bancada da Bala, também é da bancada da Bíblia, afinal se batizou no rio Jordão, eles agora assumiram as três bancadas como uma só, a Bancada em favor do Brasil, apoiaram o golpe e continuam a apoiar toda a corrupção, seja com Temer, com Aécio e companhia.

Protestos contra a PEC 181 estão acontecendo dentro e fora das redes sociais.

Em momentos de crise, os primeiros direitos a serem retirados serão os direitos das mulheres, não somente os direitos, mas também os investimentos em políticas públicas, já dizia Simone de Beauvoir. Grada Kilomba reforça que para as mulheres negras as condições são ainda mais graves. Os próprios números da violência mostram isso, entre 10 mulheres vítimas de feminicídio no Brasil, 7 são negras.

Nós, povo, nós, mulheres, nós negras e negros, nós, trabalhadoras e trabalhadores, nós, quilombolas e indígenas, nós, defensoras e defensores do Estado Laico, do Estado Democrático de Direito, dos direitos humanos, não podemos nos calar diante de tantas injustiças, mas também de tantos absurdos com a nossa Constituição que foi conquistada com muito suor e sangue!

 

1 Laina Crisóstomo é advogada feminista e presidenta da ONG TamoJuntas que presta Assessoria multidisciplinar para mulheres em situação de violência. Especialista em Gênero e Raça, pós graduada em Violência urbana e insegurança desde um enfoque de gênero e mestranda em Ciências Criminais, faz parte da Rede Nacional de Ciberativistas Negras. Foi escolhida no ano de 2016 como mulher inspiradora pelo site Think Olga e em 2017 para a lista Under 30 da Revista Forbes Brasil pelo trabalho desenvolvido com mulheres em situação de violência.

 

Referências

BATISTA, Vanessa Oliveira; DE FIGUEIREDO RODRIGUES, Luciana Boiteux; PIRES, Thula Rafaela. A Emenda Constitucional n. º 45/2004 e a constitucionalização dos tratados internacionais de direitos humanos no Brasil. Revista Jurídica da Presidência, v. 10, n. 90, p. 01-44, 2011.

BARROS, Zelinda. Escola, racismo e violência. Projeto Gênero, Raça e Cidadania no Combate à Violência. Caderno para professores. Salvador: NEIM, UFBA, p. 35-39, 2005.

DE BEAUVOIR, Simone. O segundo sexo. Nova Fronteira, 2014.

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