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Julgamento no TJ-BA sobre cotas tem resultado satisfatório para comunidade negra

“Esta é uma lei de combate ao racismo. E queremos uma política pública efetiva”, afirma o bacharel em Ciências Contábeis Hilton Sacramento.

O Movimento Negro chegou cedo ao Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), nesta quinta-feira (27). O objetivo foi pressionar e exigir a real efetividade do sistema de cotas. Posto que, candidatos lidos socialmente como brancos têm conquistado cargos através das cotas (ação afirmativa pensada para reinserir pessoas negras que foram historicamente excluídas).

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Foto: Vanessa Pinheiro

O julgamento foi acerca do concurso para Procurador Geral do Município de Salvador, no qual, foram julgados mandados de segurança que questionam a eliminação de candidatos que não tiveram sua condição de afrodescendentes confirmada pela comissão de verificação do certame.

O resultado da audiência realizada nesta quinta foi satisfatório para o Movimento Negro, os candidatos permanecem no certame, porém concorrendo em ampla concorrência e não mais pela reserva de vagas destinada para negros.

O TJ-BA reconheceu a legitimidade das bancas verificadoras. “Antes desse desfecho, o tribunal estava considerando que a comissão seria um tribunal racial. Esta tese foi superada hoje”, pontua Hilton Sacramento, em entrevista ao Correio Nagô.Os desembargadores concluíram ainda que, apesar de legítima, a banca deve pontuar objetivamente qual critério fenótipco utilizado para desconsiderar o candidato como negro, ou seja, não pode só excluir, deve dizer que o motivo foi a pele, o cabelo, os traços etc.

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Foto: Vanessa Pinheiro

Contudo, “é um avanço. Agora quem pretender fraudar, já sabe que o TJ-BA entende que a banca é legítima para excluir da reserva de vagas”, argumenta Hilton.

PELO DIREITO ÀS COTAS

Hilton Sacramento fez o concurso para auditor e analista do Munícipio de Salvador, mas não foi selecionado. Contudo, percebeu que pessoas brancas estavam ingressando por meio do sistema de cotas e, com isso, retirando a vaga de pessoas negras.

Inconformado, ele e outros candidatos buscaram o Ministério Público, sem resultado. Posteriormente, solicitaram ao Grupo de Atuação Especial de Proteção dos Direitos Humanos e Combate à Discriminação (Gedhis), encaminhando o caso à Prefeitura, que, desta vez,reconheceu a necessidade de uma banca verificadora.

“Imprimimos todas as forças nesse concurso de procurador, para que as injustiças dos concursos anteriores não fossem repetidas”, acrescentou Hilton.

BANCAS VERIFICADORAS

A professora doutora em Sociologia do Instituto Federal da Bahia Marcilene Garcia entende que só a autodeclaração não basta, assim como, o critério de foto também é falho, visto que, as fotografias podem ser manipuladas até mesmo no celular. Portanto, a doutora – que acompanha bancas verificadoras no Sul e Sudeste – considera as comissões uma garantia de menor incidência de fraude.

“Nos concursos que eu tenho participado, tenho feito pesquisas e sistematizei. Nesses concursos antes de ter banca tinha em média de 30 a 40% de brancos. Com as bancas, inibem proporcionalmente e têm em média de 3 a 4% de brancos, o que mostra que as bancas são um sucesso”, argumenta Garcia. 

Nos editais constava que a autodeclaração passaria por um critério de avaliação, contudo este processo, na realidade, não ocorria.

“Candidatos brancos se aproveitaram da não-definição do momento que seria realizado a verificação da autodeclaração e ‘arriscavam’ para ver no que dava, e aí se autodeclararam como negros mesmo sendo brancos. Passaram e não houve a verificação em nenhum momento”, relata Hilton.

Marcilene afirma que “os indivíduos que tiverem características fenotípicas serão incluídos. Temos os marcadores da cor de pele, mas também temos outros marcadores que historicamente foram utilizados para discriminar a população negra”.

“No Brasil o racismo que existe é relacionado às características fenotípicas, o chamado preconceito de marca”, acrescenta Hilton.

POLÍTICA DE REPARAÇÃO

“É uma questão de justiça, é uma questão de reparação”

A afirmação é da Promotora de Justiça Lívia Maria Santana e Sant´Anna Vaz que lembra a importância das cotas partindo da perspectiva histórica de que os negros carregam consigo mais de 300 anos de escravidão, uma Lei Áurea que não libertou e um aparato estatal que criminaliza o negro.

“A raça é um fator que condiciona o acesso das pessoas aos direitos fundamentais, então enquanto isso acontecer o Direito tem que dar relevância ao fator racial para promover a igualdade racial”, considerou a promotora.

WhatsApp Image 2017-04-28 at 13.25.29POVO PRETO PRESENTE

A ativista Maura Cristina se fez presente em todas as audiências. “Forte, resistente e lutando dignamente por um direito já conquistado, e agora necessitando ser reconquistado”.

“É importante que nós, povo negro, estejamos aqui, fazendo marcação, mostrando o que é ser preto, como é ser preto e não vacilar em guardar o nosso direito. É um absurdo ser questionado uma banca constituída por pessoas que entendem de raça”, argumentou Maura Cristina.

Maura pontuou que as audiências sempre vêm dando vistas, e considerou a atitude como manobras para que não se resolva uma questão “simples”. Para ela, os candidatos deveriam ser retirados do certame e não somente concorrer em ampla concorrência.  

Joyce Melo é repórter do Correio Nagô

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