Por A. C. Ferreira*
O site Forward publicou, em dezembro de 2016, um interessante artigo, de Jake Romm, sobre a capa da edição “Person of the year” da revista Time, cuja versão traduzida por Heloisa Jahn, pode ser lida na Revista Zum publicada no dia 15 daquele mesmo mês.
No artigo, Romm analisa a capa da Revista Time, que traz a foto de Donald Trump, com o título de “Personalidade do Ano”. Segundo a jornalista especializada em cultura, há uma interpretação equivocada de que as pessoas cujas fotos são publicadas nestas edições especiais da Time, estariam recebendo uma homenagem da revista. A Time estaria endossando estas personalidades e lhes concedendo a honra de aparecer na capa da revista. Romm descarta a hipótese do endosso e explica que o único critério utilizado pela revista é o de “pessoa que exerceu mais influência, para o bem ou para o mal, sobre os acontecimentos do ano”. E justifica citando algumas personalidades que foram capa da edição “Person of the Year” tais como Josef Stalin, o aiatolá Khomeini e Adolf Hitler, as quais não gozariam desse endosso.
No restante do artigo, cuja leitura recomendo, Romm revela detalhes da foto de Donald Trump, descreve sutilezas que podem passar desapercebidas ao olhar, mas que levarão à mente mensagens subliminares.
O foco principal do artigo de Jake Romm é a análise da foto de Donald Trump, mas eu vou pegar uma carona no trecho em que ela trata da polêmica levantada nas redes sociais, pelo fato de as pessoas, em sua maioria, entenderem que a Revista Time apoia as personalidades que figuram na capa da edição especial “Person of the Year” sejam elas “boas” ou “más”.
Em abril de 2000, tive a oportunidade de visitar a cidade de Chicago, para participar de um grande evento de tecnologia da informação, a Comdex Spring 2000. Até então, para mim, quando se falava em Chicago eu logo lembrava dos filmes de gângster e associava a cidade à figura de Al Capone, o grande gângster dos anos 30, também conhecido por Rei de Chicago. Ao chegar em Chicago, fui pouco a pouco, conhecendo suas referências:
Windy City – assim como o Rio é a “Cidade Maravilhosa”, e Nova Iorque é a “Big Apple”, Chicago é alcunhada de “Windy City”, algo como “a cidade dos ventos”,numa tradução livre;
Willis Tower – o edifício, de 108 andares, e que ainda se chamava Sears Towers, quando estive em Chicago, é o mais alto do prédio dos EUA, e já superava o famoso World Trade Center quando existia; foi o edifício mais alto do mundo, por 24 anos, até 1998, quando foi superado pelo Petronas Twin Towers, na Malásia.
Lago Michigan – é o único dos cinco chamados Grandes Lagos Americanos localizado totalmente em território estadunidense já que os outros (Ontario, Huron, Erie e Superior) estão em zona de fronteira e são compartilhados com o Canadá. Na sua margem está o Navy Pier uma área de lazer que conta com um roda gigante com mais de 45 metros de altura, restaurantes, auditórios, casas noturnas.
Voltei de Chicago com a convicção de que a imagem lendária de Al Capone, tão presente no filme Os Intocáveis, ficara restrita ao cinema. Existe um Museu do Gangster Americano, mas está localizado em Nova Iorque e não em Chicago, onde não vi nada que fizesse alusão a Al Capone ou ao gangsterismo. Apesar de Capone ter sido uma pessoa que exerceu influência sobre os acontecimentos dos anos 30, em Chicago, a cidade não faz nenhuma questão de utilizar o personagem no seu marketing turístico.
Mais recentemente, em final de 2016, estive na cidade de Piranhas, no estado de Alagoas. Situada às margens do Rio São Francisco, a pitoresca cidade cujo centro histórico é repleto de casinhas coloridas foi de onde saiu a volante (tropa policial dos anos 30) que atravessou o rio para, numa emboscada, capturar Lampião e seu bando na Grota do Angico, já no lado sergipano. Foi nas escadarias da prefeitura de Piranhas que ficaram expostas as cabeças dos cangaceiros, após a morte e decapitação. No centro da cidade de Piranhas há uma estátua de Altemar Dutra, uma pizzaria com seu nome, conta-se que ele teria visitado a cidade algumas vezes. Mas, sem dúvida, o personagem que permeia o marketing cultural e turístico de Piranhas é Lampião. Uma das lembrancinhas mais vendidas é um imã de geladeira talhado em madeira, com as miniaturas do Rei do Cangaço e sua companheira, Maria Bonita. O Museu do Sertão abriga uma coleção de objetos da época do Cangaço e conta a história dos seus personagens. Na entrada do museu, existem duas figuras, de Lampião e Maria Bonita daquelas com espaço para o turista encaixar sua própria cabeça e tirar fotos. Um dos passeios famosos na região é de barco pelo cânion do Rio São Francisco e a mocinha que tira as fotos para vender aos turistas usa vestes de cangaceira. Além do passeio de barco, outro tour bem vendido é o passeio até a Grota do Angico, onde Lampião e seu bando foram mortos pela Volante.
Nas noites de fim de semana, na praça principal da cidade, ao som do forró, um grupo de jovens homens e mulheres locais vestidos de cangaceiros encena uma performance ao ar livre, relembrando o tempo do cangaço. Ao final da apresentação, os artistas dançam com os turistas e em seguida percorrem as mesas dos bares oferecendo aos visitantes a possibilidade de tirar fotos com os casais de “Lampião e Maria Bonita”.
Al Capone não nasceu em Chicago, onde viveu e fez fama, e sim em Nova Iorque, onde está localizado o Museu do Gângster Americano. Lampião não nasceu em Piranhas, de onde saiu a Volante, nem em Sergipe, onde foi morto, e sim em Serra Talhada, Pernambuco. Ambos foram pessoas que exerceram influência, para o bem ou para o mal sobre os acontecimentos dos anos 30, em Chicago e Piranhas, respectivamente. Assim como no caso da Revista Time, coube a cada cidade decidir dar espaço ou não a estes personagens nos seus apelos turísticos.
*Antonio Carlos (A.C.) Ferreira é globe-trotter, Administrador e Mestre em Relações Internacionais