05/12/2017 / às 16h43
Por Elisia Santos
O filme para sociologia é o livro falado da sociedade. Segundo Ortoleva, em seu artigo de 1994, o filme é, ao mesmo tempo, imagem e representação. É uma representação do que é idealizado, arquitetado e interpretado em nossos sonhos e na sociedade.
A linguagem cinematográfica contribui para questionarmos os padrões estéticos, discursos dominantes e o eurocentrismo. É um universo cultural repleto de ideologias formadoras de opinião e que muitas vezes faz um desfavor para comunidade negra. Por conta disso, deve-se pensar que o cinema não está imune ao racismo, misoginia e homofobia que são tão presentes na sociedade contemporânea e, por conta disso, todo telespectador (a) deve assistir um filme com criticidade para compreender de que forma estas categorias são trabalhadas. Cinema é parte da sociedade, é um braço de um Estado manipulador, capitalista e perverso.
Platão, no livro a República, tinha toda razão quando nos apresentou o Mito da Caverna, afirmando que quando saímos da escuridão, no primeiro momento, a luz do Sol nos incomoda, deveras com o tempo nos acostumaríamos com a beleza e realidade da vida e não vamos mais fechar os olhos. Depois de sairmos da escuridão de ilusões, o sol (antirracista) brilhará para nossas vidas e o filme Pantera Negra é o sistema solar mais quente que a NASA ainda não descobriu.
Como não se emocionar com o trailer do filme? Como não se imaginar em um personagem? E, posteriormente, ficar esperançosa quando o narrador afirma que haverá um mundo de conquistados e conquistadores, sendo que os conquistados são mulheres e homens negros com poderes, armas e destruindo inimigos que todo mundo sabe quem é. Eu também quero ser uma heroína.
No elenco deste longa tem dois atores que sou apaixonada: Chadwick Aaron Boseman que interpretou James Brown, 2014, que roubou nossos corações; Forest Whitaker, este poderia citar quinze filmes, mas só preciso dizer um que marca nossa vida: O Mordomo da Casa Branca; duas atrizes: Danai Jekesai Gurira, a Michonne de The Walking Dead, 2010, que todo mundo sonhava no par romântico com o protagonista, mas o preconceito queria insistir em ficar; e, por fim, a charmosíssima Lupita Nyong’o, em 12 anos de escravidão, sem comentários a sua interpretação e beleza.
Pantera Negra será um filme de 2018 e revolucionará a população negra mundial que cresce sem assistir heróis na TV, apesar dos pedidos para Marvel e D.C. Comics, muitas vezes sem êxito. Contudo, tivemos que aproveitar Static Shock, desenho produzido pela Warner Bros e estreado no Brasil no ano 2000, no final da manhã pelo canal SBT, competindo com a personagem Diana da lendária Caverna do Dragão, que era uma verdadeira guerreira e toda menina negra sonhava dar aqueles pulos, para sair de perto do racismo dos seus “amigos”.
A geração jovem da década de 90 ficava feliz com Halle Berry, que fez duas grandes heroínas: Tempestade na franquia do X-Men, 2000 e a Mulher Gato, em 2004, deverás, ela que tem uma das melhores atuações e é considerada uma queridinha da América, afirma que adoraria fazer um filme solo da heroína mutante, pelo menos antes dela fazer 65 anos, bem, hoje tem 50 anos, para fazer um filme solo ela precisa solicitar 15 anos antes? Alguma coisa errada? Estou enxergando racismo nesta tela branca?
Não é engraçado esta cronologia, estamos falando de atores coadjuvantes negros, que sempre estiveram na cota dos filmes de super-heróis. O diretor Ryan Coogler, ao trazer este filme, ele fala de ancestralidade, força, união e poder.
Não é à toa que os comentários racistas assolam a Internet. Calma, racistas! Estamos chegando e vamos lotar as salas escuras com nossa cara preta na Tela Branca e na sala.
Não querendo apresentar um spoiler do trailer, uma das maiores sacadas deste longa, além do figurino belíssimo, fotografia e maquiagem perfeita, é o sentido (fazendo alusão ao conceito de sentido de Max Weber) de relembrar que os exploradores vieram para América para destruir e coisificar os negros e negras escravizados e esqueceram que nossa força está em África e esta força que é um “mana” extrapola gerações, é atemporal!
Para ser justa ao filme, irei propor uma trilha sonora à altura: Ain’t Got No / I Got Life de Nina Simone, para que não esqueçam que podem roubar nossos bens materiais, massacrar os nossos, mas nunca conseguirão tirar nossa liberdade, intelectualidade, sapiência e dignidade! Agora irei me ausentar deste texto e permitir que minhas leitoras (es) escutem Nina.
Suporte bibliográfico:
HALL, Stuart. A identidade Cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.
PLATÃO. A República. Trad. Maria Pereira. 8° edição Lisboa: Calouste Gulbenkian. Junho/1996.
ORTOLEVA, Peppino. Cinema e história.
Scene del passato. Torino, Loescher, 1991.
O conteúdo desta coluna é de responsabilidade da autora.