17/01/2018 |às 17h32
Todo grande movimento começa com a insatisfação frente a alguma situação desvantajosa ou injusta. A luta negra no Brasil contra o racismo e as mais diversas formas de discriminação, seja na religião, na estética, no mundo do trabalho ou na representatividade política e nos espaços de poder, foi marcada por gestos de bravura e enfrentamento, recuos táticos, perdas, alianças, jogos e dissimulações para manter em movimento a roda da história.
Das inúmeras estratégias engendradas pelos nossos, desde o sincretismo religioso, passando pela ocupação do espaço da alegria, com a invenção dos afoxés, até às agendas mais recentes de resistência, uma que merece destaque é a da criação de datas simbólicas. Seja de culto aos heróis e heroínas ou de reflexão sobre fatos ocorridos durante a história de lutas por libertação e igualdade, estes marcos têm cumprido um importante papel.
Neste sentido, um conjunto considerável de datas já foi criado nas três esferas do poder (municipal, estadual e federal). Meses também foram marcados pela luta do nosso povo, a exemplo do Agosto da Igualdade e do Novembro Negro. São balizas simbólicas. É fato. Mas é justo no campo do simbólico que tem sido mantido os grilhões da escravidão mental.
O mês de janeiro marca a passagem do Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa (21 de Janeiro). Data surgida na capital da Bahia, no ano de 2004, em resposta a um caso grave de agressão e intolerância, que resultou na morte da yalorixá Mãe Gilda, do Terreiro Ilê Axé Abassá de Ogum. Três anos depois, foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Lei que instituía a nacionalização da data.
Criado com o objetivo de promover o debate sobre o tema, o dia de combate tem sido palco para mobilizações por todo o País. Na esteira das iniciativas de ampliação desses momentos, visando à construção de novas estratégias para a conquista da liberdade de credos, estamos promovendo, entre os dias 15 e 21 de janeiro, a Semana do Respeito à Liberdade Religiosa. O objetivo é iniciar um movimento que consolide o primeiro mês do ano, como o Janeiro da Liberdade Religiosa.
Foram assim todas as nossas construções até aqui. Uma articulação onde cada iniciativa tem sido pensada para fortalecer aquelas que a antecederam. Pensar a ampliação do 21 de Janeiro para uma semana de reflexão, e em seguida, para a demarcação de um mês inteiro, como momento de luta pelo respeito, se configura como um avanço mais do que necessário.
A forma como cada um de nós se religa é profundamente íntima e individual. Exige, portanto, respeito. Não podemos compactuar com números tão alarmantes de ataques à liberdade religiosa. É imperioso nos posicionarmos. E nada mais adequado do que começarmos o ano pautando esta questão e demarcando a nossa posição. Vamos construir juntos uma sociedade mais justa, com mais oportunidades e onde as nossas diferenças não nos inferiorizem. Ao contrário, conduzam-nos para um patamar elevado de civilização. A história é repleta de exemplos de destruição da vida humana em nome de um caminho único de Salvação.
É de algo simples que precisamos: mais amor e respeito entre nós.
Sílvio Humberto é professor da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs) e vereador em Salvador