21/02/2018 | às 17h30
A peça-panfleto-itinerante NEGROR trouxe reflexão para as ruas de São Paulo com o espetáculo que trata de tema tão doloso à população negra: o assassinato consentido de sua juventude. A partir de uma metáfora com o esporte de combate boxe, o elenco composto por dois lutadores, um juiz, uma ring-girl e um fotógrafo formam quadros vivos e trazem pequenos relatos sobre casos reais de violência contra garotos negros.
O espetáculo é uma espécie de homenagem as Mães de Maio, mulheres que tiveram seus filhos assassinados pela polícia do Estado de São Paulo, no ano de 2006. A partir disso, elas criaram um coletivo, que até hoje lutam cotidianamente contra a violência pública contra a população negra.

FOTO: Divulgação
A morte é o resultado final e mais alarmante do racismo, por isso também o nome das peça foi estrategicamente pensada, como conta o diretor Sidney Santiago, ao Portal Correio Nagô: “O título NEGROR vem justamente da associação entre as palavras negro e horror, de forma a contextualizar a barbárie que vivemos. Ainda somos alvos e sujeitos suspeitos”.
Desde 19 de janeiro, NEGROR vem fazendo apresentações itinerantes em localidades não tradicionais, como praças, largos, estações de trem e metrô nas periferias de São Paulo.
Amanhã (23) ocorrem as últimas apresentações desta temporada, com a realização de um ato “VIDAS NEGRAS IMPORTAM”, que reunirá artistas e lideranças como Douglas Belchior, Salloma Salomão e a Cia Os Crespos. As apresentações serão na Avenida Paulista (frente do Masp) às 13h e às 17h, na Praça da República.
Por que o lutador de boxe como personagem?
“O boxe surge como uma metáfora. Quando o boxe surge nos Estados Unidos, ele surge como um a briga de oponentes. Os escravizados tinham que lutar pela sua vida e pelo patrimônio do seu senhor, e o boxe ainda hoje é um esporte onde as pessoas pagam para ver dois homens, historicamente dois homens negros, se digladiando.
Por que é tão comum e por que me causa tanto prazer ver dois homens se digladiando? Isso tem haver com essa desumanização que é um processo histórico. Para nós o boxe surge nisso, como pegar uma alegoria, que nos é particular, e a partir dessa alegoria propor uma reflexão ” – Sidney Santiago.
A violência tem cor
Segundo dados do Atlas da Violência 2017, as pessoas negras tem 23,5% mais chances de serem assassinadas. Esse número se torna ainda mais assustador quando se trata de homens negros e jovens, que o número de mortes supera o de países em situação de guerra. O coletivo Mães de Maio alerta a sociedade brasileira sobre “como vivemos em uma sociedade equivocada, porque temos a policia que mais mata e que mais é morta no mundo. Morrem mais jovens negros no Brasil do que nas guerras da Síria, do Afeganistão”.
Ainda com informações do Atlas da Violência, em 2012, o risco de um jovem negro ser vítima de homicídio era 2,6 vezes maior do que um jovem branco. Não é difícil perceber que a violência tem cor e persegue os negros, por isso todo cuidado é pouco, em seguida algumas dicas de sobrevivência para um jovem negro em um país racista como o Brasil.
Dicas de sobrevivência para um jovem negro*:
- Não saia sem documentos, principalmente carteira de trabalho.
- Evite sair de casa altas horas.
- Sempre deixe alguém ciente de onde estará e se chegou em casa.
- Procure estar sempre acompanhado na rua.
- Não deixe o seu celular sem bateria. Você poderá usar para filmagem ou fazer uma ligação se necessário.
- Ande com a nota fiscal, caso esteja usando algum produto caro.
- Evite correr na rua, para não quererem te confundir com um “suspeito”.
- Em caso de “blitz”, não faça movimentos bruscos. Caso necessite, pergunte se pode abrir a bolsa ou o porta-luvas.
- Tente gravar a placa da viatura, nome no uniforme e o número do batalhão (deve estar na viatura e/ou no uniforme).
*Sugestões propostas pelo militante Rodrigo França, em uma postagem, em relação a intervenção militar corrente no Rio de Janeiro.
Beatriz Almeida é repórter-estagiária do Portal Correio Nagô.
Com a supervisão da jornalista Donminique Azevedo.