Assassinato de George Floyd por policiais gera onda de protestos contra o racismo nos Estados Unidos
Por George Oliveira*
“Não consigo respirar!”
Essa frase não é de nenhuma das milhares de vítimas do Covid-19 espalhadas pelo mundo. Lembrei dela ao ver cenas de uma abordagem policial onde um homem negro, já imobilizado e sem apresentar nenhum perigo aparente, tinha o seu pescoço pressionado pelo joelho de uma policial. Uma coisa a ser pontuada e que me revoltou mais ainda foi o fato de que o policial sente-se tão confortável, na maior parte do tempo, ao mantém as mãos no bolso. A vítima era segurança em um restaurante em Mineápolis, no estado de Minnesota, nos EUA, George Floyd de 46 anos foi abordado por policiais na noite de 25 de maio de 2020. Um vídeo de 10 minutos divulgado, nas redes sociais, mostra Floyd suplicando e dizendo repetidamente “não consigo respirar” para um policial branco.
Em 2014, também nos EUA, durante uma ação policial, Eric Garner, um homem negro que trabalhava como vendedor ambulante, repetiu onze vezes a sua dificuldade em respirar e mesmo assim foi morto em conseqüência da abordagem policial nos EUA, caso teve uma merecida repercussão mundial. Embora tenha resistido à prisão, Garner não estava armado. Pai de seis filhos, o homem de 43 anos perdeu a consciência devido ao ato brutal e foi levado a um hospital onde foi declarado morto. Para exigir responsabilidade de policiais por mortes de negros desarmados, esse caso originou os protestos conhecidos como #BlackLivesMatter (Vidas Negras Importam). Após cinco anos, o policial foi demitido e preso por matar Eric asfixiado. A justiça foi feita e a família do afro-americano ganhou o direito a uma indenização de U$ 6 milhões, aproximadamente, R$ 18,5 milhões na época.
Notícias como estas fazem parte de uma realidade que nos deixa inquieto e apreensivos. Mas porque trazer casos dos EUA se a nossa realidade aqui é similar? Acredito que isso se deve ao fato destes casos terem uma repercussão mundial e porque lá a comunidade negra tem dado respostas mais incisivas nas ruas, imediatamente após o fato. Aqui no Brasil os casos são bastante recorrentes, onde sabemos que o alvo é a juventude negra, que vem sendo vítimas, mesmo quando estão dentro de suas casas.
Infelizmente, não se tratam de uma casos isolados, você deve recordar que no ano passado, aqui no Brasil, um segurança de uma supermercado matou um jovem negro de 19 anos com um “mata leão”. As repetidas histórias, que desta vez teve como vítima Pedro Gonçalves, que foi imobilizado pelo segurança e foi possível ver, em vídeos divulgados na internet, que há uma desproporcionalidade na força empregada pelo segurança com o golpe onde está deitado por cima do rapaz, que está imóvel no chão e aparenta estar inconsciente. Sabemos que essa força “extra” é motivada pelo racismo que nos coloca como alvo desse extermínio institucionalizado. Em todo país, foram organizados protestos no supermercado e o caso está sob responsabilidade da Delegacia de Homicídios do Rio de Janeiro.
Seguimos atentos e preocupados com o acirramento do racismo em tempos de pandemia.
Com o uso obrigatório das máscaras, nós que já somos alvo de julgamentos maliciosos e acusações levianas, estamos ainda mais vulneráveis. Mesmo passando a maior parte do tempo em casa ou trabalhando na linha de frente do combate ao Covid-19 ou em serviços essenciais, usar a máscara como (auto)proteção ao contágio tem se tornado um grande problema. Num relato de um jovem de 23 anos de idade que se passa em Salvador, a cidade mais negra do Brasil, ele conta ter sido vítima de insultos racista do tipo: “… agora que todo mundo está usando máscara, vai ficar mais fácil para eles roubarem.” A sua reação no momento foi chorar sobre a máscara que utilizava enquanto esperava o transporte público. E ele revela que os “olhos que condenam” continuam no seu cotidiano, seja no banco, no supermercado ou na farmácia, como uma forma de nos exterminar e nos manter num risco constante.
Dois fatores dificultaram a conclusão da escrita deste texto. O primeiro deles é o forte caráter emotivo de falar sobre extermínio, como todo homem negro, as situações do cotidiano nos deixam apreensivos com tudo que está posto. O outro motivo é que esta semana a repercussão da desumanidade que resultou na morte de um xará nos EUA reacendeu os protestos anti-racistas e as imagens não param de chegar. Pode ser que volte com a repercussão dos protestos.Vários amigos postaram algumas dessas imagens e (se) questionaram: “Será que um dia a gente aprende?”
Sonho com o dia em que será possível respirar tranqüilo!
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* George Oliveira é doutorando em Educação/UFBA grbo2003@yahoo.com.br @grbo26
Publicado em 29/05/2020
Veja as imagens da violenta ação policial, em Minneapolis, que causou a morte de George Floyd