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Caso Mirian França: o limite do racismo institucional

Para advogado “Existem muitas Mirians e Valdiceias dentro e fora da prisão. Poucas têm a oportunidade de contar a sua própria história”.

Foto I Brasil de Fato

Foto I Brasil de Fato

Redação Portal Correio Nagô

A prisão temporária da farmacêutica e doutoranda da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Mirian França, 31, suspeita de matar a italiana Gaia Molinari, foi revogada nesta terça-feira, 13. Ela saiu da prisão, mas não poderá se ausentar do Ceará pelo prazo de 30 dias. Para o advogado Humberto Adami, que acompanha o caso, as declarações da mãe de Mirian, sobre motivações racistas para a acusação e prisão sem provas da pesquisadora, alteraram o tratamento ao caso.

Em entrevista ao Portal Correio Nagô, Humberto Adami, advogado de Valdiceia França, mãe de Miriam, destacou que a história ganhou uma nova direção quando Valdiceia falou para imprensa, no dia 02 de janeiro, que “fica fácil culpar uma ‘neguinha’”. “Depois disso, o fato foi direcionado à temática racial, para o racismo e, assim, foram modificando o perfil da acusada”. Assim, a sociedade ficou sabendo que tratava-se de uma cidadã sem antecedentes, uma pesquisadora de alto nível, com artigos publicados e não uma aventureira, como no primeiro momento transpareceu nas reportagens sobre o caso.

“Antes, Miriam era somente ‘uma carioca’. Depois, ela passou a ser nomeada como farmacêutica, doutoranda da UFRJ. Isso modifica muita coisa”, pontua Adami. “Existem muitas Mirians e Valdiceias dentro e fora da prisão. Poucas têm a oportunidade de contar a sua própria história. A mãe de Miriam soube aproveitar o espaço da mídia. Este fator foi muito favorável a elas”, frisou o advogado.

Racismo institucional – A coordenadora dos Direitos Humanos do Centro de Estudos Afro-Orientais da Universidade Federal da Bahia (Ceao-Ufba), Vilma Reis, afirma que a prisão de Mirian França foi “o limite do racismo institucional”. “Ontem (13/01), antes de recebermos a notícia de que Mirian tinha sido solta, nós, das lideranças do movimento negro e de mulheres, já estávamos planejando ir até o Ceará para pressionar o Judiciário do estado. A polícia e a delegada cometeram todos os erros. As medidas foram tomadas sem controle judicial”, afirma a militante.

Mirian França foi presa, sem provas, no dia 29 de dezembro. Ela foi acusada de ter assassinado a italiana Bárbara Gaia Molinari, que foi encontrada morta no Ceará, na praia de Jericoara, local onde a doutoranda também tinha frequentado no mesmo dia do crime.

Diante do acontecimento, Vilma Reis conta que as instâncias do sistema criminal do Ceará ficaram diante de um “grande escândalo”. A saída de Mirian do presídio foi uma vitória coletiva e de destaque. “Mostramos que nós temos mecanismos para reagir ao genocídio da população negra”, comenta. Segundo ela, as pessoas envolvidas com a solução do caso mobilizaram a Defensoria Pública do Estado do Ceará, que manteve relação com a Defensoria de outros estados, no intuito de solucionar a questão da estudante. A coordenadora diz que houve toda uma manifestação pela liberdade de Mirian.

Mirian França vai continuar sendo acompanhada pela Defensoria Pública do Estado do Ceará. Em entrevista cedida ao G1, a defensora pública Gina Moura disse que a decisão “contempla dois interesses, a do respeito ao direito de liberdade e o da investigação policial”, disse. “Estou feliz [com a decisão], pelo reconhecimento da ilegalidade de uma prisão nesta circunstância”, afirmou.  Por ordem da justiça, Miriam não pode sair do Ceará até os próximos 30 dias.

O Correio Nagô tentou contato com a doutoranda, mas de acordo com Humberto Adami, Mirian e Valdiceia não estão recebendo ligações. Elas estão “incomunicáveis”, afirmou.

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