O jornal Correio* publicou nesta sexta-feira, 02/04, reportagem com informações exclusivas do laudo sobre a chacina ocorrida na Vila Moisés, bairro do Cabula, Salvador, em fevereiro deste ano, durante operação das Rondas Especiais (Rondesp). As informações, ainda preliminares, dos laudos cadavéricos realizados pelo Departamento de Polícia Técnica (DPT) nos corpos baleados no Cabula, confirmam aquilo que familiares e testemunhas já denunciaram à imprensa: os 12 jovens negros (apenas dois com antecedentes criminais), foram executados.
O caso ganhou repercussão nacional, com reportagem na revista Carta Capital e no programa Profissão Repórter, da Rede Globo, que ouviu testemunhas que atestaram a versão de execução policial.
Logo após a chacina, o governador Rui Costa deu declarações polêmicas, duramente criticadas por ativistas dos direitos humanos. A primeira de que nenhum policial seria punido pelo ocorrido, “pois não há indícios de crimes”. Logo depois, em entrevista coletiva, o chefe do executivo baiano comparou a ação polícia a de artilheiros: “A polícia (…) tem que definir a cada momento (…), ter a frieza e a calma necessárias para tomar a decisão certa. É como um artilheiro em frente ao gol que tenta decidir, em alguns segundos, como é que ele vai botar a bola dentro do gol, pra fazer o gol (…).”
Laudo – De acordo com as análises dos laudos, informa o jornal, parte dos disparos foi realizada de cima para baixo. Além disso, alguns mortos apresentam perfurações na palma da mão, braços e antebraços, sendo que apenas quatro baleados tinham vestígios de pólvora nas mãos (o que rebate a justificativa de que os polícias foram recebidos por bandidos fortemente armados). Os laudos também apontam que a maioria apresentava pelo menos cinco marcas de tiros — alguns deles disparados a curta distâncias, de menos de 1,5 metro.
As perfurações em um dos jovens indicam que o projétil entrou na base da cabeça e saiu pelo queixo. A reportagem informa ainda que, em alguns casos, foram identificados tiros que atravessaram simultaneamente antebraços e braços e um dos baleados levou um tiro na palma da mão.
Uma fonte ligada à investigação do caso, consultada pelo jornal Correio*, afirmou que disparos desse tipo indicam que as vítimas foram mortas em posição de defesa e que há “sinais evidentes de execução”. Outro especialista ouvido pelo jornal também vê indícios de execução pelo fato dos disparos terem sido de cima para baixo. “Isso indica que a pessoa morta está numa região mais baixa do que quem atirou. Isso subentende que a pessoa baleada estava deitada, agachada ou ajoelhada”, informou. A fonte, que pediu anonimato, deduz ainda que as vítimas com marcas de perfurações no antebraço e braço devem ter sido pegas de surpresa, por isso elevaram o braço.
Denuncia – “Nós nunca duvidamos que eles foram executados. Estamos denunciando esse tipo de violência da polícia há muito tempo e ninguém faz nada. Acreditamos que haverá justiça”, declarou ao jornal o ativista Hamilton Borges, representante da Campanha Reaja ou Será Mort@.
Borges também chamou a atenção para as possíveis consequências dessa investigação. “Esse caso foi apenas mais um de muitos. Precisamos continuar acompanhando para que não haja retaliação aos familiares ou aos movimentos envolvidos nesse processo”, defendeu ele. Em março, durante audiência na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, na OEA, em Washington-EUA, para tratar de extermínio de jovens negros no Brasil, Hamilton Borges denunciou as execuções sumárias pelas forças policiais do Brasil, e lembrou da Chacina do Cabula.
A reportagem do jornal Correio* também traz declaração do presidente do Sindicato dos Peritos Criminais de São Paulo, Eduardo Becker Tagliarini, que ponderou na análise dos dados. “Sem informações da topografia do local, posição dos atores, armamento utilizado, vestígios, sede e orientação das lesões e dos danos no local, não temos elementos suficientes que permitam propor uma hipótese para o ocorrido”.
O caso é investigado por meio de inquérito pelo Departamento de Repressão e Combate ao Crime Organizado (Draco), da Polícia Civil, além de Inquérito Policial Militar (IPM) e procedimento investigatório do Ministério Público do Estado (MPE). Em nota, a Polícia Civil informou ao jornal que dezenas de pessoas já foram ouvidas, entre policiais, sobreviventes, testemunhas e profissionais direta ou indiretamente envolvidos na ação.
Da redação do Correio Nagô, com informações do jornal Correio*