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Comunidade negra de Cachoeira prestigia Contos de Azeviche

Com público de quilombolas e comunidades de terreiros, Contos de Azeviche encerra primeira temporada na cidade de Cachoeira, Recôncavo da Bahia. Montagem é resultado de pesquisa realizada na Escola de Teatro da Ufba. 

O espetáculo teatral Contos de Azeviche encerrou a primeira temporada nos dias 07 e 08 de junho, com três apresentações na cidade de Cachoeira, para um público muito especial formado por comunidades tradicionais, como remanescentes de quilombos e religiosos do Candomblé, além de moradores e visitantes da histórica cidade do Recôncavo da Bahia.

Após ocupar o auditório Milton Santos, do Centro de Estudos Afro-Orientais da Universidade Federal da Bahia (CEAO / UFBA), em Salvador, a peça foi apresentada em Cachoeira, no Cine Theatro Cachoeirano e no Terreiro do Caboclo Guarany de Oxossi, destacando a cultura e as heranças afro-brasileiras por meio da arte cênica.

Elenco com o público. Ao centro, Maria Abade (de torso) e Pai Pedrinho Silva (de vermelho) lideranças negras de Cachoeira.

“Como mulher negra e quilombola, me senti representada neste espetáculo. Um belo trabalho de reconhecimento e valorização do nosso povo negro e sua cultura”, elogiou Maria Abade, liderança da comunidade Engenho da Ponte, na Bacia do Iguape, em Cachoeira. A líder quilombola e mais 36 moradores da comunidade viajaram por cerca de 50 minutos até a sede da cidade, em uma sexta-feira chuvosa, para conferir o espetáculo. “Valeu muito a pena, foi tudo muito bonito e nos encheu de orgulho pela nossa origem e cultura”, destacou Abade.

Outra liderança cachoeirana presente na plateia do espetáculo foi o babalorixá Pedrinho Silva, do Ilê Axé Otá Lomin, terreiro da nação Nagô-Vodum. O pai de santo também teceu muitos elogios ao espetáculo: “Onde tem seriedade e respeito com a nossa religiosidade, a espiritualidade se faz presente. Este espetáculo é magnífico e é possível sentir a força da ancestralidade neste trabalho”, afirmou o religioso ao final da apresentação.

Entre os mitos africanos encenados em Contos do Azeviche, tem destaque a mitologia dos orixás, deuses que regem as forças da natureza e receberam do Criador (Olodumaré, para os iorubás) o poder sobre forças naturais como o mar, os rios, o trovão, a chuva e, inclusive, a terra, onde todos os homens habitam e de onde retiram seus sustento e sobrevivência.

Terreiro

Um dos momentos mais marcantes da passagem do espetáculo em Cachoeira foi a apresentação feita para a comunidade do Alto do Rosarinho, onde está localizado o Terreiro do Caboclo Guarany de Oxóssi, liderado pela mameto de Inkisse Madalena (conhecida como Mama). “É muito importante que vocês estejam aqui apresentando este trabalho de valorização da religião africana, especialmente da cultura Bantu, com a linguagem e as divindades Bantu, para fortalecer essa cultura que todas as pessoas deveriam conhecer, respeitar e valorizar”, disse a religiosa do terreiro que é da nação Angola.

A plateia que assistiu dentro do terreiro foi formado em sua maioria por crianças da comunidade que, atentas, prestaram atenção para a performance corporal e musical que dá vida às histórias da mitologia africana. “Vocês estão lidando com forças espirituais ancestrais e o que presenciamos aqui hoje mostra que os orixás estão presentes, confirmando que vocês estão no caminho certo. Desejo sucesso a todo o grupo”.

Pesquisa da Escola de Teatro da Ufba

Foto Divulgação: Heraldo de Deus

Inspirado em narrativas da literatura afro-brasileira e resultado de intensa pesquisa sobre mitologia africana, teatro negro, música e ritmos afro-brasileiros, o espetáculo tem encenação de Érico JosÉ, professor da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia (Ufba), também responsável pela adaptação de texto, preparação corporal e iluminação.

O elenco é formado por Juliete Nascimento, Lailane Dorea, Matheus Cardoso e Victor Edvani, atores e pesquisadores, que também fazem parte da Escola de Teatro da Ufba (Etufba). A produção, co-encenação, análise de texto e construção de adereços é de Ana Paula Carneiro e a iluminação e operação de luz de Thelma Gualberto (ambas licenciadas em Teatro pela Etufba). Um dos destaque da montagem, a direção musical é de Emillie Lapa, que é cantora, compositora, instrumentista e aluna especial do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas (PPGAC/Ufba) e Natalyne Santos, licenciada em Teatro pela Etufba e mestranda em Artes Cênica pela PPGAC/Ufba, que criaram canções originais a serem executadas ao vivo durante o espetáculo.

Contemplado pelos editais ProCeao Ufba 1/2017 e PibiArtes 2017/2018, o projeto Contos de Azeviche proporcionou que toda a equipe aprofundasse uma pesquisa sobre as heranças africanas para a arte e a cultura brasileiras. Desde setembro de 2018, elenco e diretores adentraram no universo da cultura negra, pesquisando sobre temáticas como o candomblé e a mitologia dos orixás, ritmos como o Jongo e toda a riqueza da performance africana que agora ganham a cena por meio do espetáculo Contos de Azeviche.

Texto e fotos em Cachoeira: André Santana, publicados em 11/06/2019 

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