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CONHEÇA YASMIM: baiana, de apenas 8 anos, destaque no Karatê Adaptado

A constatação de que, ao nascer, a pequena Yasmim não mexia um dos braços, ocorreu na primeira noite de vida extrauterina, ainda no hospital. Era o segundo parto de Renaide e, mais do que nunca, a professora estava atenta a todos os detalhes que aquele momento envolvia.

“Eu me recordo que a médica falou ‘tem que ser agora senão vão as duas’. Nesse tempo que eu apaguei tiraram ela a força, não foi à fórceps, foi puxando mesmo. Eu fazia força, mas ela não saía. Quando puxou, torceu o nervo clavicular”, lembra a mãe de Yasmim, Renaide Santos.

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Yasmim teve paralisia obstétrica, uma lesão nos nervos responsáveis pelo movimento e sensibilidade das mãos, dos braços e dos dedos, resultante de dificuldades no parto, quando manobras do obstetra tracionam a coluna cervical. Ocorre em cerca de 25 a cada 10.000 nascidos. FOTO: Arquivo Familiar

 “Quem vê Yasmim não percebe o que ela tem. Antes dava para notar o bracinho que não mexia direito. Eram várias situações de preconceito nos ônibus, afinal a gente andava muito de transporte coletivo para poder fazer a fisioterapia. Eu me lembro muito pouco da infância dela porque foi bem corrida”, recorda, com a voz embargada, a pedagoga, que se desdobrava entre o ofício de educadora e as demandas para acompanhar o desenvolvimento da filha, além de cuidar de Maurício, o primogênito.

Renaide percorreu diversos lugares para garantir, pelo SUS, a fisioterapia intensiva. Durante um longo período foi necessário cruzar a cidade de Salvador, praticamente, de uma ponta a outra numa tentativa de amenizar o considerável prejuízo da função ocasionado pela lesão sofrida no parto.

Oito anos depois aquilo que poderia ser uma limitação – decorrente da paralisia braquial obstétrica – foi estudado e trabalhado para que Yasmim ganhasse mais mobilidade e autonomia, contribuindo para a sua inclusão social. E é nesse contexto que o Karatê Adaptado entra na vida da família Santos.

“Ela foi evoluindo com a estimulação precoce, passando por todas as etapas. Começaram a me dizer que precisa levá-la para o esporte. Mas como seria possível, se não era algo fácil de conseguir? Se você colocar em uma escola particular tem, mas no caso dela, que era voltado para a parte de deficiência, ninguém queria pegar. Foi aí que eu fui para o Instituto Bahiano de Reabilitação (IBR)”, lembra.

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Ruptura nos ligamentos impediam que a gartota mexesse o braço direito. Com tratamento, hoje, Yasmim é uma jovem promessa no esporte brasileiro, na modalidade Karatê Adaptado.  FOTO: Arquivo Familiar

 Com três anos, Yasmim começou a fazer natação. “Foi aí que entrou o Karatê Adaptado, por meio do professor Erick Chaves. Ele sugeriu ao IBR, além da natação, oferecer também esta modalidade” .

Tempos depois, o professor fundava o  Instituto Bahiano de Karatê Adaptado – IBKA. Trata-se de uma instituição particular –  regulamentada pela Federação Baiana de Karatê – que busca a inclusão social através da arte marcial. É cobrada uma mensalidade para manutenção do espaço das atividades no bairro de Brotas, necessitando de um espaço próprio, com mais acessibilidade.

“Há quase sete anos atrás conheci o professor  Erick Chaves que resolveu  atender a uma consulta de Educação Física para Yasmim – que por algum motivo  substituiu  o professor que não havia comparecido. Mas Deus é um grande pai e tinha preparado este encontro, não foi um acaso era um encontro exato e preciso”, lembra Renaide.

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Yasmim com o professor Erick Chaves. Foto: Arquivo Familiar

Já nos primeiros katas, Yasmim já dava sinais de que a história com o karatê iria longe. No entanto, o que a família não imaginava é que a garota começaria a trilhar a carreira de esportista na modalidade Karatê Adaptado.

Em 2014, já como carateca, ficou em primeiro lugar em um campeonato local soteropolitano. Pouco mais de um ano depois, Yasmim conquistou ocupava o lugar mais alto do pódio no Campeonato Brasileiro, em Sergipe. No ano seguinte, em São Paulo, também o 1º lugar no Campeonato Brasileiro. Iniciando as competições deste ano, conquistou o primeiro lugar na etapa Pernambuco do campeonato nacional de Karatê Adaptado.

A menina de poucas palavras e de muitas conquistas, que gosta de brincar de bicicleta, avança a cada dia, mas os desafios ainda são muitos. A maioria deles ligados à falta de apoio para a prática do esporte, que em 2020 será uma das modalidades das Paralimpíadas, em Tóquio, no Japão.

“A gente tem uma vida bem simples. O kimono novo custou R$ 230. Ela usa este para as competições. Para o treino, ela usa o antigo que estava meio curto e que a gente emendou um palmo com outro tecido”, revela Renaide.

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Yasmim durante treino no IBKA. FOTO: Arquivo Familiar

 “Somos trabalhadores brasileiros, então nada é fácil”, conta o pai de Yasmim, Marcos Santos, que trabalha como motorista de ônibus. “Faço tudo por minha família. Tudo que estiver ao meu alcance para não deixar faltar nada”, complementa.

Uma das maiores dificuldades para quem participa de competições é o deslocamento para outras cidades, principalmente quando ocorre em outro estado. “A gente faz vaquinha quando tem as viagens para uma ajuda coletiva”, conta Renaide.

No Brasil, o acompanhante da pessoa com deficiência em viagens aéreas tem direito a um desconto mínimo de 80% no valor da passagem. A pessoa com deficiência deve pagar o valor integral da passagem.

Para o professor Erick Chaves ainda há muito preconceito na sociedade em relação a deficientes físicos e intelectuais. Além disso, conseguir patrocinadores para esportistas é um desafio vivido pela maioria dos atletas.

“Exames de faixas, campeonatos, apresentações são ações que fazemos para que eles estejam mais incluídos na sociedade. O preconceito precisa ser quebrado de dentro para fora. A deficiência não é incapacidade”, reitera Chaves.

MAS, AFINAL, COMO FUNCIONA O KARATÊ ADAPTADO

A modalidade tem como proposta a prática da arte marcial karatê com movimentos flexíveis dentro do limite de cada integrante, de forma que as necessidades especiais de cada aluno estão agrupadas de acordo com os seus pares.

No caso do IBKA, por exemplo, o projeto é dividido conforme a faixa etária dos aprendizes: de 3 a 5 anos fazem parte do Instituto Baiano de Karatê Adaptado (Baby), a partir dos 5 anos, integram o Instituto Baiano de Karatê Adaptado (IBKA). Só é permitida a matrícula para alunos que apresentem os critérios que enquadram a criança como especial, atendendo as normas do projeto que exige uma autorização médica para que o aluno possa dar início às atividades. Hoje, as aulas são mantidas em um espaço localizado em Brotas.

“A pessoa com deficiência é tratada igualmente a todos os praticantes do karatê, diferenciando apenas no que precisa ser diferenciado, ou seja, tratar iguais como iguais e desiguais como desiguais na medida de sua desigualdade”, explica Erick Chaves.

Quem deseja colaborar com o IBKA, pode contactar o Instituto no Facebook.

Donminique Azevedo é repórter do Portal Correio Nagô.

 

 

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