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Diferente dos discursos oficiais, racismo atinge população do norte do país

“Não existe racismo no norte do país”

Norte do país, região que vem desenvolvendo práticas ameaçadoras para a comunidade dos índios, negros também passam por dificuldades e são frequentemente vítimas de racismo. A professora da Universidade Federal do Pará (UFPA) Maria Antonia Nascimento afirma que a questão étnico-racial no Pará não é diferente da realidade do Brasil. Ela conta que, no estado, os negros, em grande maioria, são encontrados em atividades informais ou em trabalhos formais ganhando de um a três salários mínimos.  “O discurso governamental diz que não há racismo no local, já que a população negra no Pará é minoria. Nós sabemos o quanto isso [posicionamento do governo] é uma farsa, uma desculpa”, pontua.

Maria Antonia Nascimento, que também é coordenadora do Programa de Extensão Acessando Política Pública Raça/Etnia e Assistente Social, diz que, atualmente, as discussões, no Pará, sobre a temática racial são poucas. Segundo ela, essa situação se deve ao pouco recurso financeiro dos movimentos que debatem e levam para a sociedade assuntos referentes ao racismo. A pós-doutora em Políticas Sociais acrescenta dizendo que, na década de 80, a pauta racial era mais presente no estado, já que o Centro de Estudos e Defesa do Negro no Pará (CEDENPA) tinha mais investimento. “Hoje, o órgão tem dificuldade para manter um secretário e o espaço funcionando. Atualmente, não há, no Pará, um trabalho, uma militância aguerrida”, finaliza.

O preconceito racial causa dor e silêncio no Pará. Maria Antonia Nascimento diz que, desenvolvendo uma pesquisa, notou que as pessoas possuem dificuldade em falar sobre questões raciais. Ela revela que os entrevistados falam da sua condição em vários aspectos, mas, quando são abordados no quesito raça, o “silêncio vem como resposta”. “Esse tipo de pergunta não vale a pena desenvolver porque dói muito. Vai mexer em uma coisa que eu não quero falar. Não adianta. No Brasil, é assim”, disse uma entrevistada para a pesquisadora. A docente informa que, quando se vai estudar, na universidade, temas em torno das relações étnico-raciais, alguns julgam o “pesquisador como neurótico, como um individuo que quer desestabilizar a ordem, a harmonia do sistema brasileiro”.

Raphael Castro, que afirma que há casos de racismo na universidade, comenta que não é fácil um negro estudar na UFPA. “A universidade não é pensada para negros. Toda a estrutura é excludente. Não é pensada para abrigar negros”. Ele diz que, mesmo com as cotas, ainda há um número pequeno de negros na instituição, mas conta que tem visto, na federal do estado do Pará, “mais negros, mais pessoas com cabelo black power, na autoafirmação, na resistência”.  Maria Antonia Nascimento ressalta sobre a condição dos não negros na academia. “Eu penso que a discussão sem a problematização não consegue avançar as relações étnico-raciais. A dissimulação dela prejudica o avanço da construção de uma sociedade mais igualitária e democrática”, fala.

 

Raphael Castro

Raphael Castro

Na sexta-feira, 20, será realizado na UFPA, no Campus Básico, o I Seminário de Consciência Negra e Comunicação, que discutirá a atuação dos negros nos veículos de comunicação e redações publicitárias. Sobre o evento, o diretor do Centro Acadêmico de Comunicação da UFPA, Raphael Castro, diz que é preciso continuar falando sobre a comunidade negra na universidade. “As pessoas precisam entender que não é um debate vencido. É importante bater nessa tecla”, menciona. O graduando afirma que só há “uns cinco” estudantes negros na turma dele. Maria Antonia Nascimento fala que há mais negros africanos na universidade do que negros brasileiros. Ela salienta que nota as dificuldades, na instituição onde ensina, de se debater assuntos que são norteados pelo viés étnico-racial. “Na UFPA, terceira universidade a adotar o sistema de cotas no Brasil, eu observo as dificuldades que os meus colegas, professores, técnicos têm em discutir temas pelo recorte étnico-racial, pensando para além da tolerância e no dizer ‘eu não sou racista’”.

A professora opina dizendo que tem que ter disciplinas nos currículos dos cursos de nível superior que discutam sobre o racismo e as desigualdades étnico-raciais. Sobre a política de cotas, a pesquisadora fala positivamente, mas ressalta que deve existir mais ações de combate ao racismo. “O acesso dos negros nas universidades é importante, mas tem que ter supervisão e avaliação no acompanhamento do grupo. O acesso é muito pouco para quebrar o preconceito no Brasil”, conclui.

Da Redação do Correio Nagô

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