Pioneira em adotar as cotas nas regiões Nordeste e Norte, a Universidade do Estado da Bahia (UNEB) está realizando processo eleitoral para reitoradX e vice-reitoradX. A comunidade acadêmica deverá participar da votação no dia 3 de outubro.
Três chapas disputam o pleito. Carla Liane Nascimento Santos e Joabson Lima Figueiredo integram a chapa “UNEB com a nossa cara”. José Bites de Carvalho e Marcelo Duarte Dantas de Ávila formam a chapa que concorre à reeleição da reitoria intitulada “Somos todXs UNEB. Valdélio Santos Silva e Márcia Guena dos Santos formam a chapa “Novos caminhos para a UNEB: Diversidade e participação”.
Em meio às campanhas eleitorais – marcadas por uma série de debates – o Portal Correio Nagô ouviu candidatXs sobre a pauta racial e de gênero.
Por ordem alfabética dos nomes dXs candidatXs à reitor (a), apresentamos as considerações feitas a este veículo:
Conversamos com a professora adjunta, doutora em Ciências Sociais e especialista em Direito Constitucional do Afrodescendente, Carla Liane, candidata a reitora. De acordo com o projeto de gestão de sua candidatura, é necessário “olhar para a UNEB sob essa perspectiva demanda: preparo para trabalhar com estudantes negros, indígenas, oriundos de escola pública na graduação e na pós-graduação; ampliar cotas; olhar apurado para as questões étnicas, de gênero e diversidade sexual que permeiam todos os ambientes da universidade, com escuta e rapidez na resolução dos conflitos ocorridos nas relações cotidianas; propor medidas inclusivas e de respeito à diversidade, na perspectiva dos direitos humanos, desde a linguagem escrita das resoluções e documentos oficiais, passando pela inclusão dos debates sobre racismo, diversidade sexual e gênero nos currículos; criar programa de acompanhamento dos estudantes cotistas visando a permanência e a auto emancipação”.
Carla Liane atuou como vice-reitora da Uneb até julho deste ano, quando anunciou em seu perfil no Facebook o rompimento com o atual reitor da instituição, José Bites. “Na verdade eu me senti durante esses três anos e meio subjugada, invisibilizada e não-partícipe das decisões da Universidade. Era como se eu fosse um apêndice. Para mim, isso não é uma coisa simples porque se trata de uma relação de homem branco com uma mulher negra. Para mim, nós deveríamos então trabalhar essa relação de forma mais atenta. Não foi o que aconteceu. O que aconteceu foram três anos e meio de muita resistência, de resiliência de minha parte. Eu, inclusive, era tida até como a birrenta, a antipática porque sempre questionava e exigia que a gestão fosse avaliada. O fato é que o reitor sempre decidiu tudo a partir do seu próprio gabinete. Para mim, ele sempre destinou missões e ações externas à Universidade. As ações de dentro da Universidade só caberia a ele representar”, explica. José Bites foi contactado sobre assunto, mas não se pronunciou.
Contactamos José Bites (atual reitor), mas Bites não concedeu entrevista ao Portal Correio Nagô.
O projeto de gestão apresenta propostas no que diz respeito às ações afirmativas, a exemplo da “implementação da proposta de ampliação da reserva de vagas para quilombolas, portadores de necessidades especiais e transsexuais/travestis”.
Novos caminhos para a UNEB: Diversidade e participação
Entrevistamos o mestre em Sociologia e doutor em Estudos Étnicos e Africanos Valdélio Silva. Ex-coordenador Nacional do Movimento Negro Unificado (MNU), Valdélio está no segundo mandato como diretor do Departamento de Educação, do Campus I, em Salvador. Tendo Márcia Guena como candidata à vice-reitora, a Chapa encampa os temas da diversidade e participação.
“A decisão de incluir a questão de gênero e raça em nossa chapa está relacionada a questões que são de fundamental importância. A primeira é que tanto na história da professora Márcia Guena, quanto na minha, esses assuntos sempre estiveram presentes do ponto de vista intelectual, como também do ponto de vista da ação política. A segunda razão é que a UNEB é uma universidade diversa do ponto de vista de gênero, racial, regional, cultural e da sua instituição como universidade ao longo da sua história. É uma universidade marcada notadamente pela inclusão”, justifica Valdélio. Ele acrescenta ainda que: “existe hoje uma violência racial aberta, especialmente, com a assassinato de jovens e crianças negras nas grandes e pequenas cidades do Brasil inteiro. Além disso, existe uma violência inaudita contra as mulheres. Como podemos nos furtar de incluir no nosso programa tais questões?”
De acordo com programa de gestão desta Chapa, “a universidade mais feminina, negra e indígena da Bahia, pioneira na implantação do sistema de cotas raciais no Brasil, precisa mostrar essa cara. Reconhecimento, identidade e representatividade são dimensões fundamentais da ideia contemporânea de democracia e, na universidade, determinam políticas e projetos de ensino, pesquisa e extensão. Definem lugares de fala distintos, que só os próprios falantes podem ocupar, destituindo o velho e autoritário hábito de falar pelo outro”.
Donminique Azevedo é repórter do Portal Correio Nagô.