De acordo com o Mapa da Violência 2012, produzido pelo Instituto Sangari e publicado pelo Ministério da Justiça, a Bahia é oitavo estado em número de homicídios contra mulheres. São cerca de seis mortes para cada grupo de 100 mil mulheres. Estes números trazem no entrelace a inoperância do Estado e a herança do ensinamento colonial dado pelo homem de como agredir às mulheres, especialmente as negras – que são a maioria dentre as vítimas. A escassez de delegacias especializadas e a negligência dos governantes podem ser possíveis fatores que corroboram com esta estatística. Entretanto, nos últimos anos o movimento social de mulheres vem ampliando os ecos das suas reivindicações o que tem feito aumentar o número de denuncias de violência e abuso de mulheres.
Salvador ocupa a 16ª posição, dentre as capitais, em casos de mortes de mulheres, e registra cerca de quatro homicídios para cada grupo de 100 mil mulheres. Acerca desta diferença, entre capital e interior, Carla Akotirene, Mestre em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo (Neim / UFBA), afirma: “Em Salvador, possivelmente, o controle social atua de forma diferenciada. Há atuação distinta do Ministério Público, embora o índice de letalidade seja absurdamente alto”. Akotirene é assistente social e defendeu, em 2011, uma dissertação de mestrado sobre a interseccionalidade do racismo e sexismo institucionais na prisão de mulheres, a partir de estudo de campo no Conjunto Penal Feminino de Salvador. “O femicídio não tem a ver com a emancipação da mulher. Os assassinatos de mulheres são consequências de relações sociais pautadas nas opressões de gênero e raça e jamais em meras subordinações de classes, mesmo porque estas últimas são conjunturais”, afirma a pesquisadora.
De acordo com números levantados com a Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher, no bairro do Engenho Velho de Brotas, em Salvador, no período entre 2007 e 2011 as medidas protetivas saltaram de 132 para 549. No entanto, os números de homicídios femininos continuam a crescer. Para Vilma Reis, socióloga e Mestra em Ciências Sociais pela Ufba, isto configura uma falha do atual sistema: “Ao mesmo tempo em que temos mais recursos para coibir a violência contra nós, mulheres, não existe um recuo deste tipo de comportamento. Nós aperfeiçoamos a política, mas ainda é difícil que os mecanismos se desdobrem. Ainda existem brechas nas leis que ‘protegem’ os agressores”.
Contextualizando a informação de que estados do eixo Sul/Sudeste, a exemplo de São Paulo e Rio de Janeiro, apresentam uma ligeira queda nos números de homicídios femininos, enquanto Bahia, Maranhão, Goiás e Pará – por exemplo – se deparam com um crescimento significante nos casos, a socióloga completa: “Institucionalmente, uma das explicações é que as políticas para barrar estes números, na maioria das vezes, só acontecem quando há interferência do Governo Federal. 87% da política de enfrentamento contra a violência feita no Brasil são criadas com recursos federais. No âmbito da cultura, vemos a população exposta a produções culturais e programas sensacionalistas que contribuem para a criminalização da população e exacerbação da sexualidade. Obviamente sabemos que estes programas também acontecem no Sul e Sudeste, mas os abusos que observamos no Norte e Nordeste chegam a ser mais violentos. Até por serem lugares secularmente abandonados”, defende a ativista.
Para Carla Akotirene, o combate à violência contra a mulher deve ser ininterrupto. E as experiências exitosas que foram acionadas pelos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, devem ser implantadas em outros estados: “Para se alcançar a redução nos índices de homicídios, os mecanismos implantados no Sul/Sudeste podem ser objeto de aproveitamento e adaptação a cada realidade. Sejam aquelas no âmbito do judiciário, das polícias ou dos organismos estatais e da sociedade civil incumbidos diretamente nas campanhas, denúncias e apoio às mulheres vítimas de violências.”, finalizou a assistente social.
Por Lucas Caldas e André Santana
Fotos: Josafá Araújo