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Homossexuais buscam asilo na África do Sul, mas encontram desemprego e preconceito

Maioria dos países africanos considera o homossexualismo um crime, sendo que em muitos deles a pena é de prisão perpétua

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A homossexualidade é considerada crime em 32 dos 54 países da África, onde prisão perpétua e até mesmo pena de morte são as punições definidas por lei para aqueles que desrespeitarem a constituição nacional da sua região. Primeiro país do continente a legalizar o casamento gay, a África do Sul se tornou destino para aqueles em busca de liberdade sexual.

Ao desembarcarem no que ficou conhecido como “a terra prometida”, porém, falta de emprego e preconceito são as realidades encontradas pelos carimbados como “refugiados sexuais”.

Conforme informações do Departamento de Assuntos Internos sul-africano, organização governamental que controla e regulariza a entrada de imigrantes no país, a África do Sul recebe anualmente um dos maiores números de refugiados do mundo. Com 30.000 pessoas formalmente registradas, o governo acredita existir outros milhares que habitam a região ilegalmente.

Em documento oficial que procura estabelecer o número de refugiados no país, o diretor geral do Departamento de Assuntos Internos, Mkuseli Apleni, afirma que a constituição progressista e a situação econômica estável da África do Sul são alguns dos motivos para a alta demanda de imigrantes. Mas se antes a região sul-africana servia como fuga para problemas como guerra civil e fome, atualmente existe um aumento do pedido de “asilo sexual” – homossexuais que são considerados criminosos nos países onde vivem buscam refúgio principalmente em cidades como Johannesburgo e Cidade do Cabo.

Locais como Mauritânia, Nigéria e Sudão definem a homossexualidade como um crime que pode resultar em pena de morte. Em Uganda, atos com pessoas do mesmo sexo são motivo para sentenças de prisão perpétua, enquanto Botswana destina até sete anos atrás das grades para quem é gay. Em novembro do ano passado, a República do Zimbábue finalmente retirou do seu código criminal o ato homossexual, condenável desde 1995. Apesar disso, a discriminação por parte da população e até mesmo do governo ainda é alta.

David Von Burgsdorff, coordenador da organização sul-africana Passop (Pessoas contra o Sofrimento, a Opressão e a Pobreza, na sigla em inglês), afirma que o número de imigrantes em busca de “asilo sexual” é cada vez maior. “São pessoas que precisam fugir de seus países pelo simples fato de serem gays. A proximidade geográfica da África do Sul e as 72 entradas no país por terra tornam este o destino mais fácil e rápido”, explica.

Fundador do primeiro programa de apoio a refugiados LGBT no país, Burgsdorff lamenta a falta de dados por parte do governo sul-africano. “Eles não possuem controle de quantos refugiados estão aqui por problemas como fome ou guerra, ou porque estavam sendo perseguidos em suas regiões devido a sua sexualidade. No nosso dia-a-dia com os refugiados, nós percebemos uma alta demanda de apoio à comunidade LGBT, por isso criamos um departamento na nossa instituição somente para isso”, conta.

Preconceito familiar

Junior Mayema dá nome e rosto à falta de números. No ano de 2010, o congolense de 24 anos teve que fugir de sua cidade natal para tentar salvar a sua vida. “Comecei a ser perseguido pela minha comunidade quando minha família descobriu que eu era homossexual. Mas o que me fez ir embora foi a manhã em que eu acordei com a minha mãe tentando injetar gasolina no meu sangue ”, conta.

Antes disso, o então estudante de direito da cidade de Kinshasa foi submetido a um “processo de cura” em uma igreja local. “Fiquei em jejum por semanas. Eles diziam que isso iria tirar o diabo que habitava o meu corpo”.

Quando Mayema não mudou o seu comportamento, o pastor local afirmou que a única saída seria a morte. “Comecei a ser perseguido e espancado pela minha própria família e amigos. Quando pedi ajuda à polícia fui ameaçado de prisão. Minha vida estava em risco, então eu vim para a África do Sul”, explica.

Mas ao desembarcar no que era definido como a “terra prometida” pela comunidade LGBT do Congo, o que Mayema encontrou foi falta de emprego e discriminação. “A vida é complicada aqui. Existe preconceito contra homossexuais, contra negros e contra refugiados. Eu sou as três coisas”, afirma quem já foi espancado mais de três vezes em terras sul-africanas.

O fato não é isolado. No ano de 2001, Daisy Dube, uma drag queen do Zimbábue, foi assassinada em frente a uma casa noturna na Cidade do Cabo. Conforme testemunhas, os atiradores gritaram “Morte aos gays!”, antes de disparar contra a vítima. Em maio de 2012, uma imigrante de Uganda teve sua casa vandalizada na favela de Khayelitsha. Uma mensagem foi escrita em uma de suas paredes: “Fora, lésbica!”.

Coordenador do projeto de apoio a refugiados homossexuais, Burgsdorff explica que todo imigrante sofre com problemas de xenofobia na África do Sul. “A comunidade sul-africana tem muito preconceito contra imigrantes, então eles acabam se agrupando em comunidades de congolenses, nigerianos e etc. Mas no caso do refugiado homossexual, além de ser rejeitado pelos sul-africanos, ele também vai ser discriminado pela própria comunidade pelo fato de ser gay”, afirma.

Investigação

De acordo com Burgsdorff, o preconceito também ocorre por parte das autoridades sul-africanas. “Nós já recebemos milhares de relatos de atos de humilhação cometidos por oficiais do Departamento de Assuntos Internos, que são responsáveis por registrar e legalizar os refugiados no país. Já aconteceu de eles rirem e ridicularizarem transexuais e travestis”, conta.

O orgão governamental passou a ser investigado depois que um casal gay de refugiados, legais no país, teve o direito de união matrimonial negado por um oficial no final de 2011. Porta-voz do departamento, Ronnie Mamoepa afirma que os resultados da investigação ainda não foram divulgados.

Em documento oficial, a Passop pediu o treinamento de oficiais para lidarem com casos de refugiados homossexuais. “Eles não sabem como ajudar essas pessoas. Eles precisam ser treinados para isso”, reclama Burgsdorff. Mamoepa declarou que vai revisar o projeto, mas que todo oficial entende que é “inconstitucional negar papéis e direitos a um imigrante somente pelo fato de ele ser gay”.

Fonte: Opera Mundi

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