Obras infantis com protagonistas negros e histórias que resgatam a ancestralidade africana fortalecem a construção das identidades em crianças negras.
Em casa ou na escola, os livros de histórias infantis, despertam a imaginação dos pequeninos e servem como uma porta de entrada para o autoconhecimento. Especialmente na primeira infância, período que vai desde o nascimento até os seis anos de idade.
Os pequenos leitores nessa etapa de desenvolvimento, estão construindo sua identidade, assim, se apropriam de valores e desenvolvem sua autoestima. Diante de todas as diversidades e especificidades de nossa sociedade, o livro se torna um canal de múltiplas possibilidades.
Assim, tudo aquilo que os pequenos têm acesso e convivem, tornam-se referências na construção de suas teorias de mundo, suas ideias de família, de sociedade, de relações e de si mesmos. Dessa forma, se uma criança sempre consome livros ou programas em que um padrão (de comportamento ou de imagem) se repete, aquela mensagem será captada como uma verdade para ela.
A abordagem de livros infantis, que valorizam a construção da autoimagem e da cultura negra, é necessário e causam impactos positivos na formação da criança perante os desafios de uma sociedade racista. Embora nos últimos anos o assunto seja recorrente na educação infantil, a presença de protagonistas negros na literatura infantil ainda não é expressiva.
Essa é a realidade enfrentada pela advogada Eliete Teixeira, mãe das gêmeas Débora e Yasmin, de quatro anos. Eliete conta que desde a montagem do quarto das meninas, quando ainda estava grávida, comprava bonecas negras e livros que com histórias de protagonismo negro, porém encontrava dificuldade nas buscas, “eu cresci sem referência e odiando minha cor, aprendi a me amar e amar minhas raízes já adulta, não quero isso para minhas filhas, quero que elas entendam que podem ser princesas negras e o que quiserem, ainda nessa fase, e encontrar isso nos livros facilita a criar esse mundo na mente delas”, conta.
A pedagoga Michele Santos leciona para alunos de três a seis anos, para ela é fundamental ter uma literatura com representantes negros, “falar sobre nossa ancestralidade é imprescindível, tendo em vista que a criança passa a maior parte do tempo na escola, é nosso dever falar sobre nossa cor, sobre nosso passado de reis e rainhas, já que é difícil ver nos desenhos príncipes e princesa, com a pele escura, com cabelo crespo, é necessário trazer livros com protagonistas, onde a criança se sinta representada e cresça valorizando suas origens”, explica.
Sensibilizar as crianças para o respeito às diferenças é necessário. Fortalecer a autoestima por meio de uma reflexão de que há espaço para todos serem os protagonistas de uma história é romper as barreiras do preconceito que perpetua as desigualdades. A literatura infantil é uma excelente aliada, já que muitos autores têm se dedicado a falar, de forma lúdica, sobre racismo, representatividade e ancestralidade negra. Pensando nisso o Correio Nagô, preparou uma lista com sete livros onde o protagonismo negro é presente:
A princesa do olhinho preguiçoso
Escrito pelo jornalista baiano Ricardo Ishamel, o livro infanto-juvenil, conta a história de Lalá, uma menina que, aos seis anos, foi diagnosticada com ambliopia, quando um dos olhos “enxerga” menos do que o outro. O tema principal é o bullying.
Ricardo Ishmael propõe o diálogo entre família e escola, e sugere que o debate sobre o bullying deve estar presente em todos os espaços sociais.
O menino de asas invisíveis
Segundo livro infanto-juvenil do escritor e jornalista Ricardo Ishmael, narra a saga do pequeno Hadouk, que viaja na imaginação até chegar à Terra Mãe, ao continente dos antepassados.
Asas que surgem misteriosamente levam o pequeno herói à África, e o colocam diante da sua própria história. O menino descobre que é descendente de reis e rainhas africanos, de um povo guerreiro que viveu em paz e harmonia até a chegada de traficantes de pessoas.
A África recontada para crianças
Com muita criatividade, este livro nos convida a uma viagem pelas histórias contadas nos países africanos, onde também se fala português. Angola, Moçambique, Guiné- Bissau, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe… Lá tem lobo, coelho, leão – e muitas outras aventuras.
As histórias deste livro são, acima de tudo, bem humoradas. Atravessadas por adivinhas, músicas, descrições de gastronomia, vestimentas e tantos outros elementos que formam a cultura de um país. Um tributo à África, à língua portuguesa e aos contadores de histórias. As crianças agradecerão, e nós, adultos, também.
O pequeno príncipe preto
Escrito pelo ator e diretor Rodrigo França, o livro retrata um mundo cheio de possibilidades, afeto, respeito e autoestima, onde, ao contrário do clássico francês de Antoine de Saint-Exupéry, uma criança negra é a protagonista da aventura.
Na releitura da obra, o escritor retoma a ancestralidade do povo africano, e página por página, mostra a importância da construção do amor próprio, principalmente para as crianças negras, deixando a mensagem de que elas são capazes e fortes o suficiente para enfrentar qualquer coisa.
Bucala
Do escritor Davi Nunes, o livro demonstra a forma mítica e poética que Bucala se relaciona com a natureza do quilombo e reconstrói ficcionalmente a infância feliz de uma menina no Quilombo do Cabula, no século 19, local de resistência à escravidão e um dos importantes quilombos da Cidade do Salvador.
Bucala voa no pássaro-preto, cavalga na onça suçuarana, mergulha no reino da rainha das águas doces e aprende toda a sabedoria dos reinos africanos com o sábio ancião Bem-preto-de-barbicha-bem-branca.
Sulwe
Ela é mais escura que todos de sua família. Ela é mais escura que todos de sua escola. A Sulwe só queria ser bonita e cheia de luz como sua mãe e sua irmã. Quando ela menos esperava, uma jornada mágica no céu da noite abriu seus olhos e fez com que tudo mudasse.
Sulwe significa estrela, daquelas que aparecem no céu da meia-noite. E quem não gostaria de ter um nome desses e de brilhar feito astro celeste? Para Sulwe nada disso tinha importância porque ela não tinha amigos e alguém sem amigos não é nem um pouco feliz. O que Sulwe queria mesmo era brilhar como outro astro: o sol, radiante feito à luz do meio-dia.
Sinto o que sinto
Mesmo para os adultos, lidar com os sentimentos nem sempre é fácil. Isso é o que Dan, protagonista dessa história e personagem do Mundo Bita, percebe ao longo de seu dia, enfrentando diferentes situações que o fazem ter de encarar uma mistura bastante diversa de sentimentos. Ao fim, ouve de seu avô uma história muito especial sobre seus antepassados, Asta e Jaser.
O livro do ator e diretor, Lázaro Ramos tem como objetivo ajudar as crianças a entender que é normal sentir raiva, alegria, orgulho, tudo ao mesmo tempo. Aprender a identificar e a nomear tais sentimentos é muito importante para o desenvolvimento emocional do ser humano.
Alice Souza
Com supervisão de Valéria Lima