Por Gerson Brandão*, especial para a coluna “Eta Mundo” do Correio Nagô
O Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou por unanimidade, no dia 30 de outubro de 2018, uma resolução (nº. 2439), na qual apelou a todas as entidades pertinentes do sistema das Nações Unidas para acelerar a sua resposta à epidemia de Ébola e assistência às vítimas, na República Democrática do Congo (RDC).
Uma medida tão justa quanto pontual pois, alguns dias depois da decisão, no dia 9 de novembro de 2018, o ministro da saúde do país, Oly Ilunga Kalenga, anunciou que o surto atual era o pior na história do país, em termos do número de infecções confirmadas e prováveis. Confirmando que de fato, quando não se tem meios, como é o caso do sistema de saúde nacional, qualquer epidemia invariavelmente pode se tornar um grande desastre.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), até o dia 10 de março deste ano, 923 casos do vírus haviam sido relatados (858 confirmados e 65 prováveis), incluindo 582 óbitos – uma relação de fatalidade de 63% dos casos, contra em torno de 50% de fatalidade registrada durante a última epidemia no oeste da África entre 2014 e 2016.
No entanto, o combate à doença ganha um contorno ainda mais dramático quando se sabe que grupos armados, presentes nas áreas afetadas, se opõem às ações de tratamento que são percebidos por eles como uma forma de perder a influência sobre a população para o governo.
Dessa forma, um centro de tratamento de ébola foi atacado no dia 9 de março, em Butembo, na província do Kivu do Norte, perto da fronteira com a Uganda, por homens armados, não identificados. Um ataque que causou a morte de um policial e feriu vários profissionais de saúde envolvidos na resposta contra a doença. E este foi o terceiro ataque contra uma estrutura sanitária desde que a epidemia foi declarada em agosto de 2018.
Na verdade, a desastrosa situação de segurança no leste do Congo está no epicentro de todos os desafios que o país enfrenta atualmente desde o seu impacto negativo sobre os esforços na luta contra o ébola, para atender preocupações humanitárias mais amplas, bem como os relatórios contínuos de violações cometidas tanto pelo exército nacional como por grupos rebeldes, fazendo com que várias guerras, sobretudo contra a intransigência, estejam acontecendo ao mesmo tempo.
Para vencer o ébola, é preciso, entre outras ações, encontrar um delicado equilíbrio entre melhorar e aumentar o acesso aos cuidados básicos de saúde, a neutralidade da intervenção – assegurando que a chegada do Estado não seja utilizada para operações militares contra bandidos baseados nas zonas atingidas pela epidemia; assim como a proteção dos pacientes e do pessoal médico contra ataques de grupos armados.
Dilemas que a ONU e muitas ONGs enfrentam em zonas de conflito ao redor do mundo, e que tem se tornado cada vez mais frequentes na República Democrática do Congo, uma parte do mundo em que faltam meios para suprir as necessidades mais básicas da maioria da população apesar da abundância em recursos naturais, e riqueza no sub-solo do país.
*Gerson Brandão é encarregado de assuntos humanitários da ONU, mestre em Direitos Humanos pela Universidade de Estrasburgo e atualmente pesquisa “sobre o papel das empresas privadas na proteção de civis na Republica Democrática do Congo”. E-mail: brandaoazevedo@un.org
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Publicado em 10/05/2019