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NEM UMA A MENOS: Na luta e no luto mulheres vão às ruas por direitos

Avenida Sete de Setembro, Salvador, Bahia. Faltava pouco para às 16h. O calor ainda era latente.  Em frente a uma agência bancária, Rosa, atônita, observava a multidão que acabara de sair da Praça da Piedade e seguia em direção ao Comércio. 

“E essa movimentação, é o que mesmo?”, questionou Rosa, referindo-se ao cortejo. Naquele momento, Rosa fora informada que se tratava da Marcha Internacional de Mulheres, por meio da qual mulheres de 48 países protestavam contra  o feminicídio, a exploração no trabalho/econômica e a desumanização e desierarquização das mulheres.

“Hum…Que bom. Pena que não dá para mim. Não é fácil para mim parar”, justificou. A realidade da vendedora Rosa Nascimento não é diferente de outras milhares Brasil afora. Sabe-se que – apesar da importante mobilização em torno da paralisação internacional das mulheres para este 08 de Março – não é fácil para todas as mulheres aderirem ao movimento. Especificidade esta que a militância feminina e feminista não desconsidera.

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Alexandra Santos

“Têm mulheres que não têm trabalhos formais, então para esta mulheres é ainda mais complicado. Se não trabalha, não tem o que comer. Mesmo esse dia faz diferença. Ainda é tempo de a gente lutar para quem tem menos direito poder também estar lutando. Para quem tem uma posição mais frágil, mais vulnerável, possa lutar também. Eu sou privilegiada por poder estar aqui”, reconhece a psicóloga, Alexandra Santos.

Engrossamos o coro pelo Fora Temer e contra o desmonte da Previdência sim, por serem assuntos que nos atingem brutalmente, mas estamos atentas pelo momento onde nossas dores e a ausência de nossos direitos também serão objetos de preocupação nacional, diz trecho de manifesto divulgado por Mulheres Negras de São Paulo.

O VILIPÊNDIO TRABALHISTA E O SORTILÉGIO DA PREVIDÊNCIA

Uma das principais pautas da Marcha no Brasil é a proposta de Emenda à Constituição (PEC 287/2016), mais conhecida como a “Reforma” da previdência, uma grande preocupação de Lindiara Pimentel, do Coletivo de Mulheres do Calafate.

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Lindiara Pimentel

“Esta reforma é algo desumano, principalmente para nós mulheres que temos jornada dupla. É uma forma de nos matar de vez”.

Lindiara, que já contribuiu com a Previdência por 15 anos, atualmente desempregada, aos 43 anos, não chegou a fazer os cálculos, mas não vê horizonte para gozar do benefício previdenciário, caso as medidas sejam aprovadas.

“A reforma da previdência tem um impacto grande na vida das mulheres, principalmente para as mulheres de periferia. Grande parte das mulheres se encontram sem emprego, vivendo de sub-emprego, trabalhando muito e ganhando miseravelmente”, diz Simone Alves, da Articulação Nacional de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB).

“Nós mulheres temos tripla jornada de trabalho. Quando você equipara, você não reconhece esse outro trabalho nosso”, explica Lindinalva de Paula, uma das organizadoras da Marcha, que também integra a Rede de Mulheres Negras.

INFILTRADO

Inacreditavelmente, um agressor resolveu participar da Marcha. Não deu outra. Foi identificado e expulso do protesto. Enquanto, um grupo de mulheres gritava “Fora, Danilo”, outras ecoavam “Fora, agressor”. Há poucas informações sobre o caso, mas o que se sabe é que um homem de prenome Danilo violentou psicológica e fisicamente a ex-companheira.

Diferentemente de Danilo, o jovem Wesley Conceição chegou junto na manifestação para somar. “Os homens precisam estar presentes nessa luta apoiando a demanda das mulheres. O machismo é o principal causador da violência e somos nós homens que provocamos, então temos que ouvi-las, participar, apoiar”, contrapõe o estudante de Pedagogia da Universidade Federal da Bahia.

MEU CORPO, MINHAS REGRAS

Durante todo o percurso, mulheres empunharam faixas e cartazes sobre a descriminalização do aborto.

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“Não dá para a gente falar de falar de luta feminista, de luta igualitária, sem a gente considerar que nós mulheres precisamos ter autonomia sobre os nossos corpos. E autonomia é a possibilidade de termos os nossos direitos sexuais e reprodutivos respeitados, inclusive, na interrupção voluntária da gestação”, alerta a conselheira vice-presidente do Conselho Regional de Psicologia, Alessandra Almeida.

25 DE JULHO OU 08 DE MARÇO?

“As mulheres negras construíram a data do 25 de julho, que é mais representativo para nós. Mas mesmo assim a gente, enquanto movimento, entende também que o 08 de março unifica as mulheres, mesmo tendo consciência de que temos nossas pautas específicas”, justifica a professora da rede municipal de Salvador, Elis Souza.

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Rita de Cássia

Para a militante, o movimento poderia contar maior participação das mulheres. “Infelizmente a adesão foi pequena. Não podemos culpar as colegas, mas a formação política. É um trabalho de formiguinha de formação política, de participar desses espaços que nos ajudem a refletir o nosso lugar. Infelizmente, nossa formação é muito machista”.

“Estamos atendendo o chamado de Angela Davis. Estamos na rua, como estivemos há muito tempo com Luiza Mahin, Lélia Gonzales, e tantas outras referências ancestrais negras”, justifica a educadora Rita de Cássia Pereira, integrante do Grupo de Mulheres do Alto das Pombas.

E ROSA?

Rosa Nascimento – aquela do início da matéria –  mulher de poucas palavras, acompanhou, atenta, a passagem da Marcha. Ao se despedir da repórter que vos escreve, com sorriso discreto e contido, confessou que – apesar de não saber do que se tratava inicialmente – apoiava a iniciativa.  Na luta e no luto, eu, Rosa, Lindiara, Lindinalva, Alexandra, Rita, Simone, Alessandra, Elis, Angela, e as bilhões de mulheres desse mundão, seguimos na esperança de dias melhores para todas nós! 

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Rosa Nascimento

Texto: Donminique Azevedo

Fotos: Felipe Iruatã e Vinicius Nascimento

 

 

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