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O Brasil e o 13 de maio

Assim como não houve o que comemorar em 13 de maio de 1888, não temos motivos para festejar o 13 maio de 2021. Apesar de todo esforço do povo negro deste país, de tantas lutas travadas por gerações, no país mais negro fora do continente africano, os nossos corpos permanecem sem valor. As marcas deixadas pelos 355 anos de escravidão seguem vivas em nossa sociedade, sendo reiteradas com a ausência de políticas de inserção para negros na sociedade pós-abolição e refletindo na exclusão da população negra.

Apesar de a história ensinada nas escolas de educação básica permanecer privilegiando a narrativa branca e eurocêntrica, há muito se tem consciência de que o 13 de maio é uma data fantasiosa. A Lei Áurea, assinada em 1888 pela princesa Isabel, é só mais uma história que serve para encobrir a verdadeira memória deste país. Para Cleidiana Ramos, Jornalista e Doutora em Antropologia, esta narrativa teria o objetivo de “reforçar uma ideia de que houve uma espécie de passividade dos grupos escravizados, que é a forma como o 13 de maio foi ensinado durante muito tempo.”

Segundo Zezé Menezes – da Marcha das Mulheres Negras de SP e Coalizão Negra por Direitos: “tem um contexto de total abandono, da continuidade da exploração dessa mão de obra. Hoje, mesmo na atualidade, 133 anos após essa falsa abolição, ainda existem mulheres, homens e crianças vivendo em situação análoga a escravidão, porque a escravidão não é juridicamente aceita mais pela humanidade, mas ainda tem acontecido”.

Nunca houve nenhuma política de reparação, para dar a mínima condição de sobrevivência, muito pelo contrário, essas pessoas foram jogadas a própria sorte. Nos últimos tempos, com o surgimento de políticas públicas voltadas para a população negra, o Brasil acreditou que a situação dos afrodescendentes começava a mudar, mesmo que a passos lentos. Representatividade se tornou a bola da vez! Seja na grande mídia, nas redes sociais ou na publicidade, enfim as grandes empresas descobriram que os mais 56,10% da população brasileira negra, consome produtos como leite, cerveja, cosméticos. Mesmo com todo o esforço do nosso povo, isso não garantiu valor aos nossos corpos. A sociedade segue nos matando. Por isso e apesar de termos 133 anos oficialmente sem escravidão no Brasil, o racismo vive, atuante e se reinventa para continuar a nos matar de todas as formas.

Por todas estas questões e muitas outras que enfrentamos diariamente, neste 13 de maio, a Coalização Negra por Direitos, mesmo em meio a Pandemia de Covid-19, que já tirou a vida de mais de 400 mil brasileiros, vai as ruas, pelo fim do genocídio da população negra. Os números são alarmantes, mas assim como no passado, continuamos tendo nossas vozes silenciadas, seja por armas de fogo, pela fome, ou pelo vírus da Covid-19. A Coalizão Negra Por Direitos é um movimento composto por uma série de coletivos negros de todo país, que atua em várias frentes.

Com o lema, “Nem bala, nem fome, nem Covid. O povo negro quer viver!”, os atos foram escolhidos para 13 de Maio em alusão ao marco do fim da escravidão no Brasil e a necessidade de debater o assunto sob a ótica da população negra. Dentre os temas, estão as consequências socioeconômicas da falta de assistência aos negros e negras libertos em 1888. Mais de 130 depois, as gerações atuais ainda sofrem com consequências, como a situação de genocídio cometido por agentes do estado e o elevado índice de pessoas negras mortas por Covid-19 em comparação a pessoas não-negras. 

Mais do que nunca, é necessário cobrar ações diretas para a população negra deste país, que mais morre, vítima de covid-19, e possui menos acesso a vacina. Como se não bastasse o cenário de violência ao qual é submetido diretamente, sendo este reflexo de uma sociedade desigual, sem divisão de renda ou justiça social. “Aliado a todo um processo histórico de desumanização da população negra, de desrespeito a essa população, que de fato construiu com as mãos e com a sua inteligência esse país e que o mantém, que é a população negra que paga os impostos majoritariamente, que dá sustentação a um Estado, que por sua vez utiliza suas ferramentas para oprimir e matar, a aniquilar, a juventude, completou Zezé.  

Podemos citar aqui dois fatos recentes, que indignaram o país: o assassinato dos dois jovens em Salvador, que foram flagrados furtando carne em um supermercado, e foram entregues por funcionários, a traficantes do local, para serem torturados e mortos. Literalmente “a carne mais barata do mercado é a carne negra!” A polícia do Rio de Janeiro realizou recentemente a operação mais letal do estado, no morro do Jacarezinho, executando a sangue frio 28 pessoas. E esses corpos mais uma vez são pretos!

Nos aspectos que outrora avançamos, hoje regredimos, haja vista a privação de direitos, em decorrência do atual desgoverno Federal. Apesar das cotas raciais e de todas as outras políticas públicas desenvolvidas por governos anteriores, a população negra deste país continua ocupando os menores cargos, com os menores salários. A cor da pele ainda vale mais que qualificação profissional.

13 de Maio de 2021, mais um dia para protestar!!!

Valéria Lima

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