O presidente do Equador Rafael Correa, em visita oficial à França no início deste mês, foi convidado pelo Instituto de Altos Estudos da América Latina (IHEAL), da Universidade Paris 3, para ocupar a tribuna do Grande Anfiteatro da Sorbonne, onde proferiu a conferência “Crise europeia e o império do capitalismo. Lições da América Latina”.
“A Europa está em crise, e nós, latino-americanos, somos experts nela. Enquanto vocês estão em crise, nós vivemos a vida inteira margeados por ela. Por isso, posso dizer: nós a conhecemos muito bem”. Foi traçando este franco paralelo que Rafael Correa iniciou sua exposição, a qual buscou conduzir como uma aula de economia política e também como a oportunidade para fazer conhecidas as mudanças e transições operacionalizadas por seu país, que no período de 2007 a 2012 reduziu a pobreza em 16,9%.
O presidente rememorou importantes viradas históricas protagonizadas pelo Equador, que em 1998 sofreu as graves consequências de uma crise financeira e nos últimos anos vem sendo considerado, segundo dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), o país que mais reduziu as desigualdades sociais na região. A queda é de oito pontos, e o que se vive hoje é fruto, entre outras alterações realizadas, de uma significativa reforma do sistema financeiro que foi posta em operação.
O Bem Viver
Aplaudido a cada vez em que apontava os prejuízos que uma democracia sofre ao optar pelo império do capitalismo, Rafael Correa criticou àquelas políticas, que em detrimento do bem-estar de uma sociedade, depositam seus esforços na proteção do capital financeiro. Ele afirmou que “a supremacia há de ser sempre a do ser humano”, declarou com ênfase, diante da arena lotada.
Correa sublinhou ainda a diferença entre uma economia feita com o mercado e uma economia de mercado, definindo esta “como aquela que converte tudo em mercadoria”. Para ele, o grande problema enfrentado por muitos países atualmente diz respeito ao jogo de forças que se encontra edificado num mundo cada vez mais pautado pelo fundamentalismo liberal, “de modo que as pessoas chegam a crer que não existe alternativa extra capitalismo, quando outras alternativas existem, sim”, sugeriu confiante.
Lições latino-americanas
Correa, que aproveitou o momento para também falar da integração latino-americana, a qual deve se pautar “por uma verdadeira integração, ou seja, uma integração que priorize a construção de cidadãos latino-americanos e, não, de consumidores latino-americanos”, fez um alerta para que a Europa não venha a cometer os mesmos erros praticados pela América Latina em relação à cessão ao neoliberalismo, pois, segundo ele, “ir por aí está longe de ser a solução”.
O presidente, que em entrevista coletiva concedida dias após a conferência, disse que “a esquerda é e sempre foi uma sócia e uma cúmplice da direita”, foi taxativo ao orientar que a França e a Comunidade Europeia rejeitem as recomendações que o FMI costuma oferecer em tempos de crise: “não são os cidadãos comuns que devem carregar os danos de uma crise nas costas, como costuma fazer crer o Fundo Monetário Internacional”, enfatizou deixando evidente que seguir a cartilha do FMI é aprofundar os problemas e agravar a penúria da sociedade.
Terminada a exposição, os estudantes do Instituto de Altos Estudos da América Latina (IHEAL) arguiram Correa, que muito seguro do lugar estratégico que a América Latina vem ocupando no novo desenho geopolítico do mundo, encerrou a sua intervenção declarando com todas as letras: “Estou certo de que vocês da Europa têm muito a aprender conosco, latino-americanos”.
Por Sarah Carneiro, de Paris, especial para o CORREIO NAGÔ
Fotos: Luciano Fogaça