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“Porque Salvador que tem maioria negra não conseguiu eleger um prefeito, um governador, um senador negro?”, perguntou o diretor Spike Lee ao vereador Sílvio Humberto

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Redação Correio Nagô – O diretor norte –americano Spike Lee, em visita ao Brasil, registrou o desfile do Afródromo capitaneado por Carlinhos Brown no carnaval de Salvador. Ouviu cantoras como Ivete Sangalo, Margareth Menezes. Conversou com o prefeito de Salvador ACM Neto e com o presidente do Olodum João Jorge.

Por onde passava, sua produção fazia questão de destacar que o acordo feito com produtoras internacionais não permitia a aproximação da imprensa. Mas uma das entrevistas feitas pelo diretor de filmes como “Faça a coisa certa” e “Malcom X” já dá pistas de um dos focos do documentário “Go, Brazil Go” que Lee pretende lançar até a Copa de 2014.

“Ele (Lee) traz uma questão como a cidade que tem maioria negra não tem um prefeito, um governador, um senador negro. Que mistura é essa? Porque os negros não chegam a esses cargos? O racismo é fundante”, adiantou ao Portal Correio Nagô, o vereador negro Sílvio Humberto que foi um dos entrevistados pelo cineasta.

“Eu conheço Spike Lee através de seus filmes. Sua formação política, fazendo um cinema engajado e ele vem para cá justamente por esse absurdo”, acrescentou.

Com carreira iniciada na década de 70, Spike Lee já foi indicado duas vezes ao Oscar, pelo filme Faça a Coisa Certa (1989) e pelo documentário Quatro Meninas – Uma História Real (1997). O currículo reúne também mais de 35 projetos, incluindo Malcom X (2012) e o clipe They Don’t Care About Us (1996), gravado no Rio de Janeiro e em Salvador.

Conversa – Durante uma conversa de quase duas horas, tendo como pano de fundo o Mercado Modelo e a Baía de Todos os Santos, Sílvio, que é economista e fundador do Instituto Cultural Steve Biko, respondeu aos questionamentos feitos por Lee.

“O modelo é feito para o indivíduo chegar e não para o coletivo. Nós somos três milhões de pessoas para meia dúzia conseguir”, complementou o vereador. Neste contexto, ele destacou ainda que o mérito “não é suficiente”.

“Há uma dificuldade das pessoas perceberem. O problema não é mérito. Se fosse pelo mérito, a mistura seria maior. Existe um modelo de supremacia branca que interfere na cultura organizacional”, ressaltou.

Para o economista, o racismo pode ser visto nos dias de carnaval. “Nos camarotes quem está se divertindo e quem está trabalhando? Qual é a quantidade de cada um? Parece que a cada ano o carnaval piora, ao mesmo tempo que tem alguns avanços”, disse.

426693 442613982477677 1008552672 nO vereador criticou ainda uma campanha recém lançada sobre “amar e cuidar” de Salvador. “Tem esse movimento. Mas eu prefiro que se cuide das pessoas. Porque não um foco nos jovens? Tem umas pessoas que estão estragando a cidade e não somos nós. Tem a Salvador de pedra, o desmatamento que está acontecendo”, questionou. “É preciso fazer novas perguntas. A juventude negra que não tem oportunidade”, emendou.

Soteropolitano, Silvio foi criado nos bairros da Fazenda Garcia, Garibaldi e Federação. Filho do mecanógrafo Humberto Cunha, e da doceira D. Silvia Passos, se formou aos 20 anos em Economia pela Universidade Católica do Salvador (Ucsal). Fez mestrado em Economia na Universidade Federal da Bahia e doutorado na Unicamp.

“O fato de eu chegar nesse lugar é porque existe uma barreira. Não é dada oportunidade para que todos consigam”, disse.

Para ele, quando se tenta focar o debate na causa negra a reação é imediata. “Quando a gente parte para o debate, dizem que só pensamos nisso e que a gente segrega. A gente não muda a agenda porque o problema continua o mesmo. Esse debate vem com um monte de verdades inconvenientes”, finalizou o vereador.

Por Anderson Sotero

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