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É dia das crianças, mas cadê as bonecas negras?

Passando por algumas lojas populares em shoppings, ou até mesmo na correria da Avenida Sete, é possível ver o aumento da movimentação por conta do Dia das Crianças se aproximando. Em cada loja é possível perceber quais são os brinquedos preferidos das crianças: a famosa boneca Baby Alive estampava quase todas as prateleiras, sem falar nas diversas miniaturas de super-heróis. Mas existe algo que é, há muito tempo, ausente nas prateleiras das lojas mais famosas: as bonecas pretas.

Falta representatividade no mercado de brinquedos industrializados. FOTO: Ashley Hawthorne

Considerada a cidade mais negra fora da África e, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), tendo quase 80% da sua população formada por pessoas negras, é questionável o fato de ser tão difícil encontrar uma boneca negra em Salvador. Nem nas maiores lojas ou em lojas voltadas ao público infantil é possível encontrar uma sequer. Quando questionados, os vendedores apenas dizem ter acabado muito rápido por chegarem numa quantidade mínima, com relação às bonecas brancas que chegam.

David tem 9 anos e até hoje não conhece nenhum personagem negro. O seu personagem favorito é o Capitão América, da Marvel, mas quando questionado sobre ter um boneco negro, ele diz: “eu queria muito ter um herói que se parece comigo”. Já Amanda, de 12 anos, é fã e apaixonada por Larissa Manoela. Ela diz que nunca ganhou nenhuma boneca preta, mas que sempre gostou muito da Pata, personagem da novela Carrossel.

Bem humorada e sorridente, a aposentada Maria da Conceição, 48 anos, buscava uma boneca para as suas netas. Parando na sessão de brinquedos, ela segura uma caixa cor-de-rosa com uma boneca “loirinha” dentro. “São bem poucas as bonequinhas ‘black’ pretinhas. Na minha época a gente brincava com outros tipos de brinquedos, aquelas do cabelo de milho. Mas agora a coisa está diferente, tem a boneca ‘black’. Eu queria uma ‘moreninha’, mas eu não achei, então vou levar essa branquinha mesmo.”, diz ela.

RASURAS ARTESANAIS

Assim com Vanderleia, outras empreendedoras do ramo divulgam o trabalho em feiras da capital e no interior do estado.

Se a presença de bonecas pretas é praticamente inexistente nas grandes lojas da cidade, no ramo do artesanato a coisa já muda. Existem pessoas que viram neste cenário a oportunidade de promover o seu trabalho. É o caso da professora e artesã Vanderléia Nascimento, de 34 anos, que começou a fazer suas primeiras bonecas ainda na infância, aos 11 anos. “Eram as conhecidas bruxinhas nordestinas”, ensinadas pela mãe. Só em 2014 que Vanderléia decidiu retomar o trabalho com bonecas, desta vez trazendo mais representatividade para as crianças, trabalhando principalmente com as bonecas negras e trazendo o nome Bonecas da Dinda.

Para cada boneca vendida, Georgia doa uma outra.

A designer Georgia Nunes, de 28 anos, também possui a sua própria marca de confecção de bonecas pretas chamada Amora Bonecas. Além de produzir as bonecas, Georgia também faz uma doação a cada Amora que vende. Ela deixa claro que quer levar representatividade às crianças negras e quer vê-las brincando com as Amoras.

Apresentar referências negras às crianças é de grande importância na formação de cada uma. Trabalhos como os de Vanderléia e Georgia precisam se expandir, mas para além disso, as bonecas negras precisam estar sendo fabricadas de forma industrial também e ocupando as prateleiras de grandes lojas de departamento.

“Na infância é muito importante ter algo para se espelhar. Eu sempre procurava me espelhar em pessoas iguais a mim, eu torcia por pessoas iguais a mim, gostava das músicas das pessoas iguais a mim, dos filmes em que pessoas iguais a mim faziam parte. E ter essa representatividade é muito importante para todas as crianças”, relata a cantora Ylá Borges, de 20 anos.

#MinhaPrimeiraBonecaPreta

O Portal Correio Nagô está ouvindo as internautas e os internautas nas redes sociais sobre suas experiências com brinquedos afirmativos que valorizam o povo negro. Use a hashtag #MinhaPrimeiraBonecaPreta e compartilhe conosco esta vivência.

Ashley Hawthorne é repórter do Portal Correio Nagô.

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