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Protagonismo Negro na frente e atrás das câmeras

 A Wolo TV pode ter base na capital mais negra do Brasil

O angolano Licínio Januário veio recentemente a Bahia, e durante sua estadia visitou a sede do Instituto Mídia Étnica, no bairro 2 de Julho. Na ocasião, o ator, dramaturgo e produtor, que vive no Brasil há mais de 10 anos, concedeu uma entrevista, e entre outras coisas, falou sobre o motivo da sua visita a Salvador e os novos projetos para a Wolo TV, o primeiro streaming brasileiro voltado para a população negra.  

O principal motivo da sua vinda a Bahia, durante esse período de pandemia, foi sua pretensão em montar uma base da Wolo TV em Salvador, plataforma de streaming com foco na cultura negra, lançada em 2020. Com um catálogo focado em narrativas negras, rapidamente atraiu uma audiência de mais de 25 mil pessoas, com a série de comédia “Casa da Vó”, que foi exibida recentemente na Bahia, através da TVE – TV pública, ligada ao Governo do Estado.

A plataforma tem como objetivo principal descentralizar a produção audiovisual no Brasil e oferecer oportunidades para profissionais negros que atuam no segmento audiovisual. O canal é parte de um movimento mundial, com streamings que distribuem conteúdo desenvolvido por criadores negros, como os pioneiros KweliTV e AfroLane TV, além das mais recentes, como os norte-americanos ALLBLK e Blacktag, e a baiana AFRO.TV, que também foi lançada no final de 2020.

A entrevista completa com Licínio Januário pode ser lida a seguir.

Correio Nagô: Você veio para o Brasil para estudar Engenharia, em um curto período migrou para o audiovisual, e recentemente criou a primeira plataforma de streaming brasileiro voltado para a população negra, o que te motivou a criar a Wolo TV?

Licínio Januário: A Wolo TV tem vários pontos de partida, um deles é a análise da indústria brasileira, que é toda elitista e centralizada no Sudeste e nas produtoras de grande porte, nas produtoras tradicionais, na análise do Brasil, enquanto país continental, sem uma indústria continental. O outro grande ponto é a ausência de produtoras pretas, de narrativas pretas no circuito comercial do entretenimento brasileiro, além da falta de conexão entre a indústria do entretenimento dos países de língua portuguesa. Então, a Wolo TV surge desse ponto de partida, buscando dar oportunidade para as pequenas e médias produtoras pretas, espalhadas pelo Brasil inteiro, e para que a gente entre no circuito comercial, e que a gente entre para briga de narrativas contra as plataformas tradicionais, para que a gente reconstrua a imagem da população preta dentro das grandes mídias.

Correio Nagô: Sabemos que são muitas as dificuldades encontradas no processo de construção qualquer instituição voltada às questões raciais no Brasil, quais as principais barreiras encontradas no processo de desenvolvimento da Wolo TV?

Licínio Januário: Nossa grande dificuldade foi investimento para que a gente consiga botar isso em prática, a gente fez um estudo de público. Essas narrativas são muito visadas pelo nosso nicho, pelo nosso consumidor final. E a gente teve dificuldade de conseguir investimento para botar a empresa no mercado, mas a gente conseguiu ultrapassar isso.

Correio Nagô: Qual o modelo de negócio adotado pela Wolo TV?

Licínio Januário: Nosso modelo de negócio inicial vai ser o aluguel de conteúdo, pay per view, assim como é chamado no mercado. A gente escolheu esse modelo como porta de entrada da Wolo TV porque a gente ainda não tem capital suficiente pra ter inúmeras produções, pra ter uma linha de produção em massa. Então, a gente pretende crescer gradativamente, um passo de cada vez, vamos começar produzindo conteúdos pontuais e botando a nossa plataforma também para distribuir para outras plataformas tradicionais, para outros países, e pra daqui a cinco anos a gente ter corpo para ter um catálogo suficiente, e daí partir para um modelo de assinatura. Mas mesmo assim a gente pretende ter o modelo pay per view como grande diferencial da plataforma.

Correio Nagô: A série ‘Casa de Vó’ foi o primeiro conteúdo desenvolvido pela nova plataforma de streaming, onde a representatividade norteia produção, fale um pouco sobre esse novo formato e dos novos conteúdos que estão sendo pensados.

Licínio Januário: Nós temos um catálogo super ambicioso e diversificado, a Wolo em si tem no catálogo de dez séries, cinco longa metragens e cinco programas de televisão para produzir, mas isso em torno do Brasil inteiro. Em paralelo estamos fazendo um mapeamento de outros projetos, outros talentos, outros roteiristas, pra gente trazer pra casa e desenvolver esses projetos para que eles entrarem em nosso catálogo também.

Correio Nagô: Fale um pouco dessa visita a capital baiana. O que te trouxe aqui neste momento de pandemia?

Licínio Januário: A nossa intenção é montar uma base da Wolo TV em Salvador. Esse foi o grande motivo de eu ter vindo pra Salvador agora, então foi mais uma viagem de estudo do mercado, foi uma viagem de busca de parcerias.

Correio Nagô: Como você enxerga a produção audiovisual na Bahia? O que você acredita que pode ser feito para melhorar o cenário em nosso Estado?

Licínio Januário: A Bahia é um dos maiores pólos artísticos desse país, eu sempre digo que a Bahia mostra a verdadeira face do Brasil, na verdade a Bahia mostra o caminho que o Brasil deve seguir, com as narrativas populares. E se a gente for analisar as grandes mídias, as novas mídias, não só a Bahia, como o Nordeste em si, tem os maiores engajamentos dessas novas e grandes mídias, porque aí estão as narrativas populares. Então eu acredito que a única coisa que falta é trazer essas narrativas para o circuito comercial, principalmente as narrativas negras. E pensar a Bahia e o Nordeste como uma indústria própria, sem a necessidade de atender os padrões de qualidade do Sudeste. Que o Nordeste por si só tenha força pra criar uma nova indústria do cinema brasileiro, pra criar um novo do cinema brasileiro. E o Nordeste, por si só tem a narrativa pra descentralizar o cinema brasileiro, vai trazer a verdadeira face do Brasil. E o que falta, com certeza, são investimentos, pra colocar isso em prática, mas eu super acredito que essa é uma barreira que nos próximos meses, nos próximos anos será ultrapassada. Nós pretendemos realizar outras produções originais em Salvador-Bahia, ainda para esse ano.

Texto: Valéria Lima

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