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Relação entre racismo e afetividade é tema de curso a ser ministrado por Ana Maria Gonçalves

Para saber mais sobre a relação entre preconceito racial e afetividade, conversamos com a escritora Ana Maria Gonçalves, autora do livro “Um defeito de cor” (2006) – romance histórico ganhador do Prêmio Casa de las Américas (Cuba, 2007) – e considerado leitura obrigatória dentre a militância negra.

Racismo é algo que afeta tanto quem o manifesta quanto quem é alvo dele, independente da relação entre estas pessoas, interferindo na quantidade e na qualidade dos sentimentos e das emoções.

Ana Maria Gonçalves. Foto: Christina Rufatto

Ana Maria Gonçalves. Foto: Christina Rufatto

Ana Maria ministrará de 3 a 7 de abril, das 19h às 22h, no Itaú Cultural (Avenida Paulista), em São Paulo, o curso “Racismo e seus afetos”. As inscrições terminam nesta sexta-feira (24)  e as informações podem ser obtidas por  meio do telefone (11) 2168-1876.

Cinco módulos diários dividem o curso: Solidão, Medo, Desejo, Ódio e Amor, e toma como ponto de partida a frase “Teoria é bom, mas não impede as coisas de existirem”, do médico francês Jean-Marie Charcot, grande influenciador de Sigmund Freud.

Para entender melhor a necessidade de uma formação como esta, e a pertinência deste tema, o Correio Nagô entrevistou Ana Maria Gonçalves.

Correio Nagô – Afetividade entre pessoas negras é algo que, dentre outras coisas, foi historicamente “podado” no intuito de endurecer mais e mais esses corpos. Contudo, nos dias atuais, como o racismo e a afetividade dialogam?

Ana Maria Gonçalves – É preciso primeiro que se diferencie afeto, sentimento e emoção. De uma maneira simplificada, emoção é uma reação a algo específico, geralmente automática ou mesmo inconsciente, e variam em intensidade e em positivas e negativas; sentimento não necessariamente precisa ser provocado por algo específico, mas surge quando tomamos consciência das nossas emoções; e afeto, positivo ou negativo, é algo que podemos expressar através de sentimentos e emoções. Racismo é algo que afeta tanto quem o manifesta quanto quem é alvo dele, independente da relação entre estas pessoas, interferindo na quantidade e na qualidade dos sentimentos e das emoções.

No curso racismo e seus afetos, será discorrido 5 temas: Solidão, Medo, Desejo, Ódio e Amor. Como é possível vislumbrar cada um desses temas na vida de pessoas negras?

São temas presentes nas vidas de todas as pessoas, mas que, dentro da população negra, são ampliados ou moldados pelas práticas racistas. Pretendo focar neste diferencial, neste espaço único, ainda bastante desconhecido ou comentado, que não teria razão de existir caso não existisse ou racismo ou ele fosse apenas uma prática residual.

“Teoria é bom, mas não impede as coisas de existirem”, poderia explicar como será discorrer sobre racismo e afetividade a partir desta frase do médico francês Jean-Marie Charcot, grande influenciador de Sigmund Freud?

No sentido de precisarmos pensar estratégias práticas e pontuais de enfrentamento ao racismo. Tem que haver a disputa de narrativa, porque é ela que norteia a recepção da sociedade a uma ideia nova, a uma tentativa de desmonte do status quo, a uma prática individual mais inclusiva e tolerante. Mas não deve parar por aí porque enquanto poucos discutem publicamente os rumos de ação de uma militância antirracista, os que ficam de fora da discussão, pelos mais diversos motivos, não têm a realidade amenizada por palavras ou teorias.

Em seu aclamado livro “Um Defeito de Cor”, quais principais aspectos correspondem com a atualidade?

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Tirando a escravidão como prática oficial e legal, todo o resto. As relações ainda são hierarquizadas por recortes de raça, gênero e classe; o trabalho escravo ainda está presente em grande parte dos países; o tráfico de pessoas continua bastante ativo; a riqueza e dos modos de produção continuam concentrados nas mãos de poucos; negros e negras ainda exercem as funções que brancos e brancas consideram degradantes etc… Em menor escala, porque não mais política oficial de Estado, ainda lidamos com os mesmos problemas.


Joyce Melo é repórter do Correio Nagô

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