No domingo (25), a cantora brasiliense Renata Jambeiro apresenta seu segundo álbum, “Sambaluayê”, no Sesc Tijuca, no Rio de Janeiro, a preços populares. No repertório, além de canções próprias, há “Mãe África”, de Paulo César Pinheiro; e “Xamego de Crioula”, de Zé Di, marcante na voz de Elza Soares. Nada mais apropriado para a semana em que se comemora o Dia da Consciência Negra.
Renata Jambeiro é acompanhada no palco por Leander Motta, na percussão; e Fernando César, nos violões de 7 cordas. Os dois são responsáveis também pelos arranjos, pela produção e pela direção geral. Também haverá participação especial do sambista Rodrigo Carvalho. Destaque também são as canções compostas por Leandro Fregonesi – “Segredos de Mulher”, parceria com Rafael dos Santos; “Nova Era”, com João Martins; e o samba-enredo “Sambaluayê”, com Beto Moura.
Formada em Artes Cênicas pela Universidade de Brasília (UnB), Renata Jambeiro começou a chamar atenção em 2007, quando lançou o primeiro álbum, “Jambeiro”. Logo expandiu fronteiras e se apresentou na África do Sul, em 2009; e em São Tomé e Príncipe, em 2010.
Leia a seguir entrevista exclusiva com Renata Jambeiro
O que esse seu novo álbum, “Sambaluayê”, possui de semelhante e de diferente com relação ao primeiro, “Jambeiro”?
Ambos os discos foram realizados sem patrocínio e com a ajuda e vontade dos músicos que me acompanham. O álbum “Jambeiro”, lançado em 2007, é um painel do samba, um resultado do que se faz nas rodas de samba em Brasília e nas casas de shows e bares, onde o repertório transita entre o samba-canção, samba-choro, afro-samba, samba de terreiro, samba de enredo, samba de elite, partido-alto etc.
O “Sambaluayê”, lançado neste ano de 2012, é o resultado de uma pesquisa que começou com o DVD “Sambaluayê”, gravado em 2009 e lançado em 2010. Todo o processo de concepção, criação, produção e execução partiu da pesquisa sobre as células rítmicas africanas que originaram o samba e a grande variedade e riqueza da nossa música popular. Por isso, é um disco de samba, que se comunica e dialoga com ritmos ancestrais originais que, no Brasil, tomaram formas como Côco, Boi do Maranhão, baque virado, tambor de crioula, tambor de mina, maxixe, jongo e assim vai…
Resumindo: o primeiro é um painel e o segundo é um olhar mais focado na referência afro. O primeiro vêm com referências sonoras pesadas, com utilização dos instrumentos de contrabaixo, bateria, metais… Já o segundo propõe um retorno ao pé no chão, utilizando um som mais acústico e orgânico, sem a presença de instrumentos plugados e com ênfase na organicidade do som, como um gravação dos anos 30 com instrumentos de couro e madeira.
Como você descobriu os sambas “Mãe África” e “Xamego de crioula”, e como foi interpretá-los?
Descobri “Mãe África” escutando meus discos da Clara Nunes. Apresentei a música para os produtores musicais Leander Motta e Fernando César, que optaram em fazer uma espécie de painel do que seria o disco. O que foi um desafio para todos nós, já que era uma música com o peso do nome do Paulo César Pinheiro e foi originalmente gravada pela Clara e pelo Sivuca.
Portanto, o arranjo precisava comunicar outras coisas também. O início é longo justamente para criar uma atmosfera de viagem no tempo. Já o “Xamego de crioula” escutei na voz da Elza Soares em um CD de coletâneas que tenho e costumo comprar. Ela é divertidíssima e acreditamos que seria um momento mais relaxado no disco, para que não fosse somente um discurso sério. É importante algo jocoso… para valorizar o sério e o sério não ser levado tão à sério…
Você se sente mais a vontade compondo, cantando ou os dois? Sempre foi uma preocupação sua ter um trabalho mais autoral?
Fico mais à vontade no palco, com certeza, até porque meu momento compositora é muito solitário. Percebo o sintoma da composição quando vem chegando, me recolho. Cantar está em contato direto com o outro, é a arte cênica, onde o outro precisa estar lá para que o momento aconteça e onde experimentei a vida toda. O teatro e a dança me apoiam no exercício da entrega no palco para o outro.
Isso me interessa muito. Por muito tempo escondi minhas composições e textos. Acho que há gente de nível muito alto compondo e não sentia necessidade de me arriscar nessa seara. Mas são coisas do momento da vida, está acontecendo. Lidar com isso é algo novo pra mim, mas descobri a delícia que é compor uma música e vê-la criar pernas e andar, perder o controle sobre ela. E, de repente, escutar todo mundo cantando…É mágico.
Brasília sempre foi uma cidade mais associada ao rock. Como é o cenário de samba na capital federal e como foi surgir nesse ambiente? Teve muitas dificuldades para conseguir ser mais conhecida no restante do país?
A ideia de que Brasília é igual a rock ainda está muito associado com o que Brasília exportou nos anos 80. Os tempos hoje são outros. Os filhos dos cariocas, baianos, paulistas, que trouxeram o samba para Brasília cresceram e começaram atuar na cena musical da cidade. Brasília tem o Clube do Choro que é referência no Brasil e no mundo. De lá, saem vários músicos de alta competência que querem tocar e se jogar no mundo da música.
Assim, se ligam aos cantores, que são a comissão de frente do trabalho. O ambiente do samba era muito masculino, quando comecei a cantar. Não havia mulheres sambistas. Havia cantoras de MPB que também incluíam sambas em seus repertórios. Eu mesma fiz muito show em bar colocando esse gênero musical em voga, mas meu negócio sempre foi o samba, o batuque.
A partir do trabalho que comecei a desenvolver no cenário do samba, outras cantoras foram ganhando mais e mais espaço… Hoje, há uma variedade de cantoras, sambistas que vêm fazendo trabalhos de qualidade. Desde criança ia às quadras das escolas no Rio (minha família é carioca), meus pais moviam bloco carnavalesco em Brasília…Sempre fui envolvida assim.
Então cantar samba é uma coisa, ser sambista é outra. É deixar a filosofia de vida do samba gerir sua vida. O cenário do samba na capital é muito evidente, artistas de alto nível , de outras cidades querem se apresentar aqui, o público é fiel, entende do que está ouvindo, é crítico. E o movimento entre os artistas é forte. Porém, estamos em um país que ainda acredita que você só vira artista quando fica famoso, e quando aparece alguém despontando, parece que a pessoa começou ontem, mas já está há anos trabalhando e se doando pra arte.
Como foram seus shows em São Tomé e Príncipe e Moçambique, e como começou essa sua relação com a África?
Minha relação com a África começou muito cedo, quando comecei a despertar para a consciência negra, (algo que só existe aqui no Brasil, dessa forma que conhecemos). Uma coisa puxa a outra e no meio do processo de pesquisa do DVD recebi um primeiro convite, para São Tomé. Foi incrível conhecer, ver de perto o que havíamos pesquisado. O trabalho foi aceito como se eles já o conhecessem profundamente.
Eles são o ritmo e assim foi em Moçambique, onde fizemos vários shows, um deles para o ex-presidente Lula e o presidente de Moçambique, Armando Guebuza. A aceitação do público e da mídia foi imediata, o que nos deixou imensamente felizes. E ao final do processo, lançando o CD “Sambaluayê”, acabamos de retornar de Cabo Verde, como uma temporada de workshops sobre samba e carnaval e com show para o público que me ensinou muitas coisas, inclusive, a cantar em Crioulo, dialeto de Cabo Verde. Experiências inesquecíveis.
O que o público pode e deve esperar desse show no Sesc Tijuca?
Deve esperar muita alegria, muita dança e estar aberto para receber o samba e o batuque no coração, já que o faz pulsar.
Por: Guilherme Bryan, especial para a Rede Brasil Atual
Fonte: Rede Brasil Atual