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Secretária quer efetivar o Estatuto da Igualdade Racial e Combate à Intolerância Religiosa

Foto: Adenilson Nunes/Secom Bahia

Dando continuidade às nossas entrevistas com gestoras públicas, neste mês dedicado às lutas das mulheres por direitos, o Correio Nagô enfoca as ações da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial do Governo da Bahia, uma das poucas no Brasil com atribuições específicas destinadas às políticas de combate ao racismo e às desigualdades raciais. À frente da Sepromi está Vera Lúcia Barbosa, militante do Movimento Nacional dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que chefiou a Secretaria de Políticas para Mulheres da Bahia, entre 2011 e 2014. Confira entrevista:

Correio Nagô – A maioria dos estados brasileiros não possui uma secretaria que aborde especificamente sobre ações e políticas de promoção da igualdade racial. Para a população baiana, quais são os ganhos observados depois da criação da Sepromi?

Vera Lúcia Barbosa – A Secretaria de Promoção da Igualdade Racial do Estado (Sepromi) foi criada em 2006, atendendo a uma antiga reivindicação do movimento negro, para tratar de assuntos específicos deste segmento. Desde então, com a contribuição da sociedade civil, por meio do Conselho de Desenvolvimento da Comunidade Negra (CDCN) e da Comissão Estadual para a Sustentabilidade dos Povos e Comunidades Tradicionais (CESPCT), tem atuado para melhoria da qualidade de vida da população negra.

Uma das conquistas mais recentes foi a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial e de Combate à Intolerância Religiosa, instituído pela Lei 13.182/14, importante instrumento para a efetivação da igualdade de oportunidades e defesa de direitos individuais, coletivos e difusos, além do combate à discriminação racial e demais formas de intolerância, incluindo a religiosa. Já foram regulamentados importantes capítulos deste instrumento, como os que dizem respeito ao Sistema de Financiamento das Políticas de Promoção da Igualdade Racial – normatizando a efetivação de no mínimo 10% do Fundo Estadual de Combate e Erradicação da Pobreza para as políticas setoriais de promoção da igualdade racial.

O documento também garante 30% do quadro dos concursos públicos e processos seletivos simplificados do Estado para a população negra e o respeito à terra de comunidades remanescentes de quilombos e de povos de terreiros, por meio de regularização fundiária, fortalecimento institucional e desenvolvimento sustentável.

Além disso, a pasta tem se articulado com as demais secretarias e órgãos estaduais para o desenvolvimento de ações nas áreas da saúde, segurança, educação, cultura, entre outras, a partir da transversalização das políticas públicas. As campanhas “Novembro Negro” e “Agosto da Igualdade” têm contribuído, ainda, para valorização do povo negro, com ações da sociedade civil e do poder público. Isso se dá, neste período, por meio de editais lançados pela Sepromi e campanhas de sensibilização desenvolvidas.

Vale destacar ainda o trabalho do Fórum Estadual de Gestores Municipais de Promoção da Igualdade Racial, com a participação de 94 municípios, do Grupo Intersetorial para Quilombos (GIQ) e da Rede de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa, que conta hoje com o Centro de Referência Nelson Mandela. Desde a criação do equipamento, em 17 de dezembro de 2013, já foram registradas cerca de 100 denúncias relacionadas. Além de oferecer apoio psicológico, social e jurídico a vítimas de racismo e intolerância religiosa na Bahia. O espaço está aberto ao público de segunda a quinta-feira, das 9 às 12h e das 14 às 17h, no Edifício Brasilgás, na Avenida 7 de Setembro, em Salvador.

CN – O começo deste mandato está sendo marcado por diálogos entre a secretária e secretários(as) de outras pastas. Nesta gestão, como a Sepromi pretende estreitar, ainda mais, o diálogo entre a Sepromi e a sociedade civil?

Vera Lúcia Barbosa – Tanto o diálogo com o poder público quanto com a sociedade civil é de extrema importância para o desenvolvimento das políticas públicas de promoção da igualdade racial. No mês de janeiro, me reuni com os secretários da Cultura (Secult), Jorge Portugal, de Desenvolvimento Rural (SDR), Jerônimo Rodrigues, e de Desenvolvimento Urbano (Sedur), Carlos Martins, porque considero que a parceria e a transversalidade são necessárias para que as iniciativas cheguem até a ponta, interfiram positivamente na vida das pessoas. Recebi ainda representantes de diversos movimentos sociais e entidades da sociedade civil ligados à questão racial para ter contribuições, que nortearão nossas ações nos próximos anos. Este contato direto com os baianos terá continuidade. O meu gabinete está aberto para as diversas contribuições, pois é a partir da participação da sociedade que poderemos melhorar e ampliar nossas ações. Realizamos, inclusive, uma plenária de apresentação das nossas diretrizes, no dia 29 de janeiro, momento em que recebemos representações de variados setores. Também irei até as comunidades, como fiz recentemente, visitando o Quilombo Rio dos Macacos e a região de Cajazeiras, especificamente o monumento Pedra de Xangô, para conhecer a realidade de perto e conversar com os moradores em busca de soluções. Este diálogo também se dá por meio do CDCN e CESPECT, instâncias que precisam ser ainda mais fortalecidas.

CN – Como a Sepromi vem se articulando e projetando ações em defesa dos povos e comunidades tradicionais?

Vera Lúcia Barbosa – A partir da escuta à sociedade civil, por meio da CESPECT e encontros com povos e comunidades tradicionais, a Sepromi tem se articulado com as demais secretarias estaduais para o desenvolvimento de ações de reconhecimento e regularização fundiária de suas terras, reformas de terreiros, construção de unidades habitacionais para quilombolas, valorização da tradição desses segmentos, entre outras iniciativas. Atualmente, a comissão está discutindo a elaboração do plano de desenvolvimento sustentável para os povos e comunidades tradicionais. A iniciativa está prevista na Política Estadual para o Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, instituída pelo decreto 15.634/14, que tem ênfase no reconhecimento, fortalecimento e garantia dos direitos territoriais, sociais, ambientais, econômicos, culturais e educacionais dos povos e comunidades tradicionais. O trabalho de articulação e diálogo com as demais instâncias do poder público é uma das estratégias que fazemos nesta caminhada. Vale destacar que a Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR) tem sido uma das principais parcerias neste processo.

CN – Quais as ações e projetos desenvolvidos pela secretaria que colaboram para o fortalecimento e visibilidade da arte e cultura negras na Bahia?

Vera Lúcia Barbosa – Este é um ponto muito importante e merecedor da nossa atenção. São inegáveis as contribuições da cultura negra na nossa história e para a identidade da Bahia. É isso que devemos reconhecer a cada dia, das mais diversas formas, inclusive com o fortalecimento de políticas culturais que já estão em curso e criação de novos espaços e oportunidades, enquanto estrutura de Estado. É muito legítimo que os artistas e organizações que atuam na área tenham seu devido espaço e valorização. Queremos o protagonismo de quem faz a cultura baiana/negra acontecer. Fizemos um importante e rico debate com o cantor Lazzo Matumbi, que nos visitou na sede da Sepromi, umas das figuras mais respeitadas, de grande acúmulo, experiência e capacidade incontestes. Assim tem sido este nosso momento. De nos abrir e ouvir as mais diversas representatividades da cultura negra, incluindo cantores, compositores, ativistas culturais, blocos afro, afoxés, segmento do samba, reggae, capoeira, estética afro, religiosidade/cultura de matriz africana, de povos e comunidades tradicionais e uma série de outros segmentos.

É importante dizer que todas as ações a serem projetadas e executadas caminharão a partir da observação e cumprimento do Estatuto da Igualdade Racial e de Combate à Intolerância Religiosa. O documento coloca, entre seus capítulos, que o Estado estimulará e apoiará a produção cultural do movimento negro e de grupos de manifestação cultural coletiva da população afrodescendente.

No conjunto das nossas preocupações, inclusive, também está a atenção ao Programa Carnaval Ouro Negro, que precisamos regulamentar, para que seja consolidado como uma política de Estado. Neste começo de gestão estamos dialogando com os secretários da Cultura e da Educação, também neste sentido. A mensagem da “Cultura Negra Viva”, que transmitimos na nossa campanha de Carnaval deste ano, tem embutido um pouco destas ideias e prospecções, sem dúvidas.

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