Democratas que defendem lei contra armas anunciam projeto para 2013, mas oposição foca em outras medidas
“Nenhuma lei pode eliminar o mal do mundo ou prevenir qualquer ato insensível de violência em nossa sociedade. Mas isso não pode ser desculpa para a falta de ação”, disse Barack Obama, presidente dos EUA, neste domingo (16/12), em ato memorial para os 27 mortos no massacre da última sexta-feira (14/12) em Newtown, Connecticut.
O choque que varreu o país e o mundo após Adam Lanza matar sua mãe e se dirigir à escola elementar Sandy Hook para tirar a vida de vinte crianças suscitou mais do que lágrimas: o debate em torno da regulamentação de armas no país. Apesar de o presidente não ter oferecido uma proposta específica sobre isso, nem ter marcado uma reunião urgente na Casa Branca, não foram poucos os personagens a favor de uma reforma.
Membros do Partido Democrata anteciparam que a limitação legal de vendas será uma prioridade da legislatura em 2013. À frente desse processo está a senadora da Califórnia Dianne Feinstein, que em 1994 introduziu a lei que proibia por uma década os fuzis de assalto, do mesmo tipo usado por Lanza. “Eu mesma apresentarei um novo decreto para banir a venda de armas semiautomáticas no plenário, no primeiro dia de trabalho no novo Senado. E uma proposta idêntica será introduzida para votação na Câmara de Representantes”, disse em debate político do programa Meet the Press, da NBC. Foram convidados 31 senadores a favor das armas, mas nenhum deles compareceu ao programa.
A senadora afirma que a proposta inclui a proibição da venda, transferência, importação e posse de armas semiautomáticas, além de cartuchos com mais de dez balas. O governador de Connecticut, Dan Malloy, lamentou à CNN o fim do período de vigência da lei de 1994 sem que os parlamentares tenham pensado no tipo de armas que ficariam disponíveis no mercado. Feinstein tem também o apoio de Charles Schumer, influente senador de Nova York. No programa Face The Nation, da CBS, Schumer focou em três áreas: banimento de fuzis de assalto, limitação do tamanho de cartuchos e maior dificuldade para que os “mentalmente instáveis” obtenham posse de arma.
Nem mesmo Obama estaria fora das críticas, segundo a congressista democrata Carolyn McCarthy, cujo marido foi morto e o filho ferido em um ataque em Long Island há nove anos. Ela pretende ir até o fim na defesa da restrição à venda de armas, “nem que isso signifique envergonhar o presidente e responsabilizar a administração” por sua falta de ação após uma série de tiroteios, que resultaram em “88 vítimas em 2012”.
Um outro congressista do mesmo partido, de Connecticut, John Larson, junto com outros da Câmara de Representantes, defende que a proibição dos fuzis de assalto seja acompanhada de medidas como a obrigação de comprovar os antecedentes de comprador de armas em qualquer ponto do país e a retirada dos cartuchos de até 40 balas do mercado. A ideia é que teria sido mais difícil para Lanza caso tivesse precisado recarregar sua arma.
Apenas horas depois da tragédia, a página oficial da Casa Branca mostrava uma petição, agora com 150 mil assinaturas, por leis que limitassem o acesso a armas. De acordo com o texto, lobistas pró-armas estendem a posse delas para muito além da segunda emenda da Constituição, que prevê tal direito.
Apesar disso, outras petições pediam que o presidente autorizasse “uma arma em cada sala de aula”, que antigos militares com experiência de combate fossem contratados para segurança armada em escolas, ou que a segunda emenda não fosse infringida, para não impedir “os cidadãos de se defenderem de governos tirânicos”. Nenhuma delas tinha mais do que alguns milhares de assinaturas.
A favor das armas
Essa onda a favor de uma nova lei contra armas, que contou também com o apoio de prefeitos como Michael Bloomberg, de Nova York, e Michael Nutter, de Filadélfia, traz esperança para Dan Gross, presidente da Campanha Brady, principal grupo contra armas: “Sinceramente, acreditamos que desta vez é diferente, que pode haver uma mudança”.
A história, porém, é diferente. Diversas medidas para o controle de armas, preparadas pelo Departamento de Justiça após o tiroteio de 2011 em Tucson, que feriu a congressista Gabrielle Giffords, foram posteriormente engavetadas. Tais medidas não versavam sobre quais armas cidadãos norte americanos poderiam obter, mas criava meios para que a database do FBI sobre compradores e vendedores de armas aumentasse, incluindo dados de outras agências e incentivos fiscais a Estados. A intenção era diminuir o risco de que armas ficassem em mãos de criminosos e deficientes mentais.
Além disso, na quinta-feira passada (17/12), o Estado de Michigan aprovou um projeto de lei que permite introduzir armas escondidas em escolas, apesar de objeções de diretores das instituições. No mesmo dia, outro projeto, em Ohio, permitiria armas em carros na garagem de sedes de governo. Antes na mesma semana, tribunais de recurso em Illinois derrubaram um banimento a carregar armas escondidas. Florida anunciou que logo aprovaria a milionésima arma escondida e licença de arma de fogo.
Republicanos se abstiveram do programa Meet the People de domingo, mas alguns deram outro foco a suas respostas iniciais. Rick Perry, governador do Texas, informou em comunicado que distritos de escolas públicas deveriam “rever seus planos de operação de emergência para assegurar que todas as escolas estejam preparadas para responder a ameaças potenciais como o massacre de hoje”.
A NRA, sigla em inglês para a Associação Nacional de Rifle, uma dos mais importantes grupos de interesse em Washington e outras capitais no país, disse que não comentaria “até que os fatos estivessem completamente esclarecidos”. Após a reeleição de Obama, David Keene, presidente da associação, escreveu no site do grupo que “estamos preparados para lutar contra ele em cada frente, reunir oficiais amigos eleitos, persuadir os em cima do muro e deixar todos saberem que donos de armas não permanecerão ociosos à medida que nossos direitos constitucionais são arrancados de nós”.
Inclusive no partido Democrata existe resistência. A mais destacada é do senador Harry Reid, que lidera o grupo democrata no Senado e reconheceu seu apoio à NRA no passado.
Enquanto isso, Newtown, a cidade onde ocorreu o tiroteio de sexta-feira, continua sendo a sede da Fundação Nacional do Esporte de Tiro e acumula nomes nas listas de espera para as campos de tiro, o que leva a profusão de áreas informais. O departamento de polícia registrou mais de 50 reclamações relativos a tiros neste ano até julho, o dobro do número do ano passado inteiro. E o país continua em luto.
* Com informações de The New York Times, El Pais e Publico
Fonte: Opera Mundi