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Vércia para além da revelação

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Vércia Gonçalves, ou simplesmente Vércia, é um alento estético porque quebra padrões e continua pelas vias musicais do grande talento. Uma voz que rasga e impressiona como a de outrora de Maria Bethânia – rasgando a caretice da música popular feita no Brasil. Vércia também rasga a caretice da música feita atualmente na Bahia. No cenário há alguns anos, insistem em colocá-la como uma mera revelação. A voz da moça,  35 anos, aglutina o melhor de nossas tradições negras, sem se perder na limitação de classificá-la como uma cantora étnica. Ela é universalmente negra, fazendo sons negros, mas não reduzida ao étnico, sua voz é para qualquer instrumento, qualquer plateia, para todo entendimento, belamente rascante como o canto transmundial de Maria Bethânia.

Vércia compõe. O samba é sua escola, e como boa cachoeirana, traz em si elementos sagrados da música nascida e praticada em terreiros de candomblé – e ela não confunde este sagrado com o profano promovido pelo Carnaval que, por muitas vezes, violenta as tradições religiosas de matrizes africanas em nome das demandas de mercado. A mulher que além da voz usa os olhos para cantar, estampa uma imagem de força e doçura, liminaridades entre o masculino e o feminino, difundindo uma estética negra aprimorada por uma particular forma de expressão.

As composições precisam ser amadurecidas e a voz precisa ser mais lançada aos circuitos culturais da Bahia. Vércia tem que ser ouvida, frequentada, para assim, lançar seu primeiro CD – mesclando suas novidades autorais ao repertório mágico de artistas como Clementina de Jesus. A moça é inquieta. Tem o fogo do seu orixá Xangô na paz aquática de alguma Iyabá – Oxum, Iemanjá?- só Ifá para revelar. No fundo, ela é tranquila e doce como os erês, e, contagiante também como esses seres infantis.

Vércia possui a poética da raridade. É um charme no palco quebrando previsões. Bonita no inteiro da sua negritude que espelha as peculiaridades da voz, muitas vezes rotulada de estranha e selvagem. O mais lindo é que sua voz é estranha e selvagem. O selvagem que acolhe como o castanho dos olhos; o selvagem que nos faz refletir sobre condições sociais – a vida pulula ali em sexualidades, etnicidades, economias, sexismos, homofobias… Mas ela é artista. E de coragem. Seu canto é anunciação e não panfleto. Sua emissão é para a alma que precisa ser o que não somos e precisa ter o que o dinheiro não compra.

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Vércia é para além da novidade. Um ancestral que renasce a cada nota.

SERVIÇO DE 2015

No dia 29 de maio DE 2015, às 21 horas, na Praça Pedro Archanjo, no Pelourinho, com um ingresso a 10 reais (preço único), esta menina-mulher fará o show Vércia & Muriquins, quem for entenderá muito do que digo aqui e, com certeza, reformulará novos diagnósticos sobre esta artista que tem muito que melhorar. Só não pode parar de cantar, porque pobreza demais, Salvador, é miséria!

Marlon Marcos é poeta, jornalista e antropólogo  email:  ogunte21@yahoo.com.br

Fotos Divulgação

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