Por Cidinha da Silva
Quando perguntado se o sucesso o tinha deixado mascarado, Simonal respondeu: “Eu sempre fui mascarado!” Um preto que diz ao mundo – eu sou e me basto – é um preto condenado à morte.
O homem que encontrava problemas raciais, apesar de se chamar Wilson Simonal de Castro, e declarava isso antes de cantar um hino a Martin Luther King Junior é um negro que sabe de si. De Castro, porque Simonal era corruptela de Simonar, sobrenome do médico que ajudou a sustentar sua família, supostamente mal entendido pelo tabelião no momento de registrá-lo.
Um negro sabedor de si incomoda muita gente. Se, além disso, for sofisticado, incomodará muito mais. Se fizer dueto com Sara Vaughan, se cantar samba de um jeito diferente e apaixonante, se interpretar Tom Jobim como se a música do maestro houvesse sido composta para a voz dele, se levar 40, 60, 80 mil pessoas no Maracanãzinho ao êxtase, cantando afinadamente “Meu limão, meu limoeiro”, sob a regência dele, um preto mascarado, incomodará ainda mais. À direita porque domina a massa, à esquerda porque diverte a massa.
Disseram no filme que Simonal, o rei do suingue, caiu no ostracismo porque não teve jogo de cintura. Conclusão torpe. A rima é outra; ele sucumbiu por racismo e, é lógico, contribuiu pessoal e enfaticamente para o previsível desfecho da história com sua arrogância de preto bem-sucedido, cercado de brancos, traído pela altura do Kilimanjaro.
Rei iludido, blefou ao dizer-se apadrinhado pelos milicos da ditadura. Achou que a afirmação teria o efeito cândido da amizade nutrida pelo sargento da Polícia Militar da esquina, com quem crescera. Rei refratário a entender como funciona a política, cavou a própria cova, enfeitiçado pelo sucesso. E todos, a direita, a esquerda, a imprensa, a plateia branca magnetizada e os artistas concorrentes já tinham as pás de cal para enterrá-lo.
Ninguém sabe o duro que você deu, meu velho, mas a inveja dos 320 shows por ano te derrubou. Você, como definiu alguém, não se achava o rei da cocada preta, você era o rei! Mas